Cede este momento que há em mim.
Desenrasca-me o tempo esquivo da região mórbida. Os pinheiros já eram análogos a uma ribanceira situada numa enxurrada de ervas secas e insectos infestantes. As plantações eram distantes. Giovanni sucumbia um cesto de vide a galhofar cara-a-cara com as uvas farrampil. Doces como o mel. O seu avô enviara-o lá, não obstante era um gaiato e tal nome remonta à exploração, aquando o seu bisavô era mineiro e como mineiro consumiu o filho nas minas de Portugal, no Brasil. Eram tempos grisalhos. Giovanni, seu nome tinha a ver com fugitivos, alguém fugira à responsabilidade e caÃra um nome tão impossÃvel em cima do pobre gaio comum, sem asas. Aquelas uvas farrampil soava-lhe a farrapos verdes e esféricos, tão minúsculos que era capaz de os esmagar como se não se tratassem de algo cozido ou para cozer. Contudo, a malta sabe que as uvas vão para moer, passo antecedente à fermentação. ‘ali, onde nasce o alcóol’ — dizia Giovanni a denunciar o local onde a fermentação se dá. E de uma forma muito similar descreve a sua vende em dias em que a venda se dá mal, ‘venham, venham ver esta categoria, vinho puro de uva, da melhor colheita’, isto era refutável se não houvesse uma só.
Giovanni era introspectivo e história nenhuma repleta de chantilly e waffles por baixo tinha para contar, aonde os seus dentes pudessem chapinhar na graça do chantilly que era pouco fluido, ou muito, provavelmente para quem estivesse sôfrego a escorregar numa qualquer poça de água fosse pouco fluÃdo, para quem tivesse acabado de corroer um joelho por ter caÃdo por distracção, sem mais nada, fosse muito fluÃdo. Vestia uma casaca que deixavam os seus braços à mercê de uma camisa apodrecida de peixinhos, já comia o tempo em que não reformava aquelas vestes. ‘Ai, vestes vestes!’, era o que a mãe lhe dizia todos os dias não ligando à figura das incorrecções.
Sede deste monumento que há em mim.
O seu bisavô e avô tinham um nome um pouco estranho, Barata e Boas, eram alcunhas, claro e evidente, clarividente era o avô porque o bisa já tinha morrido, esbodegado pela patada de uma lavradora, tal não era a vaca. Espicaçava o dinheiro mas não pensara que os animais também comiam ou precisavam de mais alimento que ele quando tinham de puxar a charrua. Restava-lhe o pai, mas esse, só sabia isso, que havia um qualquer confeiteiro, de botas que davam condimento para um bom chá de chulé e que tinha um pescoço que era graciosamente apetitoso para ser esganado, cozinhado, a granel. Bêbados de m…., isso já digo eu.
Não tardava a ter dezoito. A chacinar tudo o que a sua secura de criança lhe contraÃra na garganta, tal e qual a do pai. Era assim que terminava a sua história, com uma faca no gargalo dum tipo que acreditava ser justo matar por vingança, sem qualquer documento, somente porque viu nele a cara que costumava ver todos os dias ao espelho, e nos seus gestos procurou as suas semelhanças.
Passados alguns anos teve um filho. Alguém teve por ele. O cesto de uvas já embotava em solo mineralizado e fértil, o avô já estava acampado em solo sagrado e Giovanni era ‘solo’ sisudo.
Sede me deste este monumento que há em mim, ruço como uma pedra do deserto, sede de criança nunca esquecida, sede de sangue, na sede do sangue, no meu cérebro…