Estradas de má vida

[Abgalvão]

A minha vida profissional obriga-me a constantes deslocações por algumas zonas do País, e tenho reparado que a prostituição na beira de estradas tem aumentado assustadoramente.
São cada vez mais jovens a recorrer a este tipo de vida, resultado, ao que penso, do desemprego, falta de meios de subsistência e descontrole na emigração.
Este meu trabalho não pretende, de forma alguma, acusar, humilhar ou rebaixar estas mulheres, antes pelo contrário, considero-as, também, vítimas da situação a que o País chegou.



Estradas de má vida

Por estradas onde passo, bem ligeiro,
Entre moitas e pinhais que se destacam;
Vê-se jovens se matando por dinheiro
E frustrados cidadãos que vícios matam

Seminua se passeia a humilhação
Pela fímbria do extenso matagal…
E o sexo sem prazer nem emoção
Se disfarça numa cena teatral

Vê-se as marcas da desgraça bem vincadas
Nos despojos desses corpos que se “impigem”…
Nos seus olhos o sombrio das porradas
Que os “ossos do ofício” lhes infligem

A miséria e a doença marcam pontos
Nesse jogo onde a vida é a roleta;
E o tempo, que é juiz, faz os descontos
Tira tempo, ao tempo resto, d’ampulheta     

E reparo serem jovens raparigas
As que hoje se mais vêem nessa lida…
Flores sem viço que se escondem entre ortigas
Definhando pelas bermas da má vida

Não sou falso moralista nem rebaixo
A mulher que, por preciso, o corpo venda…
Mas condeno o chulo reles, vil e baixo
Que da pobre prostituta tira renda

As imagens que vos deixo, assim compostas
Sem controlo, como praga proliferam…
E na falta de projectos, as respostas
São as mesmas que outros, antes, já nos deram

São prostitutas, eu sei, muitos dirão
Que se lá estão é por vício ou por prazer;
Creio, porém, não seja essa a mor razão
Outra será, bem mais grave…é meu parecer!

Me constrange ver ao quanto a fome obriga
O que faz o desemprego ao ser humano…
E também, aqui confesso, o que me intriga
É um campo social tão desumano

Dos governos… as incúrias sucessivas
Legislando sem critérios nem matriz…
Deram azo a constantes e expressivas
Discrepâncias sociais neste país

Abgalvão

[Vanda Paz]

Pois, comigo acontece-me o mesmo....

Estão por todo o lado, é incrivel o aumento destas meninas pelas estradas, e digo meninas porque muitas delas não terão mais de 16 anos. É triste sim.

É bom trazer para todos a realidade do país.

Abraço

[margarida]

Uma triste realidade esta. Urge reflectir!

[Oswaldo Eurico Rodrigues]

Abgalvão,

teu texto fala de uma realidade aqui do Brasil também e acredito que não só de nossos dois países, mas de várias terras dos quatro cantos do mundo. Infelizmente aproveitam da necessidade das pessoas para introduzirem crianças nessa vida de prostituição. É uma lástima. Bom você fazer a sua parte denunciando através da poesia.

Oswaldo Eurico Rodrigues.

[Alice Santos]

Por aqui, bem perto das escolas, por vezes vejo meninas que ainda deviam estar a frequentar as aulas. É triste sim. Em Macau, onde vivi muitos anos, era um negócio muito rentável. Ao que me apercebi, muito bem organizado. Havia, inclusivé, fases. A das "russas", a das "venezuelanas", a das "brasileiras" (desculpem Oswaldo Eurico Rodrigues e Campista Cambral) e as eternas e residentes tailandesas. As tailandesas eram as mais antigas e quando iam para Macau era sempre para empregos desses. O curioso é que já as filipinas iam para empregadas domésticas. Pelo que pude ver nas viagens que fiz à Tailândia, por lá também é esse negócio que sustenta o país. Vemos crianças bem pequeninas, vemos mulheres, vemos travestis, mulheres que já foram homens (é muito comum). É um mundo tão diferente... não são só as praias...
Desculpe, isto já nem parece um comentário ao seu texto mas... veio à memória tanta coisa...

[Abgalvão]

Os meus agradecimentos a todos quantos, simpaticamente, comentaram este meu poema.
Beijos e abraços

[carlossoares]

Abgalvão,

A temática, de tão velha, se torna crescentemente nova e actual, como em versos excelentes nos transmite. Deprime e abate o nosso desejo de crença no Homem como autor, responsável, do seu destino, individual e colectivo. E não é o salve-se quem puder. Antes fosse. As associações criminosas, os tráficos que fornecem e alimentam vícios, as redes em que são apanhadas as pessoas, mercê da sua dependência, necessidade, ilusão, desequilíbrios, loucura..., não têm merecido a necessária atenção e a preocupação dos políticos e dos órgãos decisores. Cada vez mais iremos ser forçados a pensar sobre o que desejamos e somos capazes de fazer para que as nossas vidas tenham dignidade. Nem com as mais estilizadas indumentárias do chamado desenvolvimento a imagem que os espelhos reflectem é reconfortante e lisonjeira.
Abraço

[Goreti Dias]

Infelizmente, a necessidade obriga ainda a alguns recursos anti natura. Até quando?!

[anamarques]

Não é por acaso que se chama à prostituição a "mais velha profissão do mundo".
Penso que é uma realidade que é transversal ao tempo e ao espaço.
Eu por acaso passo todos os dias por uma estrada onde "trabalham" umas senhoras que me impressionam pela idade avançada. Sinceramente não sei o que me choca mais, se as muito novas ou as que têm idade para serem avózinhas.
Gostei do poema.
Abraço.

[Abgalvão]

 Ana Marques
 Goretidias
 Carlos Soares
Os meus agradecimentos pelos v/comentários
Beijos e abraço