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Autor Tópico: SONHO DE NATAL  (Lida 2382 vezes)
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Jorge Vieira Cardoso
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Sobscrevo frases e dou-lhe a nossa morada....


« em: Dezembro 18, 2009, 11:00:18 »

Naquela terra lá para os lados do pôr-do-sol existe uma linda capelinha voltada de costas para o arvoredo e de frente para a população carente do "Bairro Do Fim do Mundo".
Tem dias que a capelinha recebe uma visita, tem outros que recebe duas e nunca mais de três. Reclama-se lá no bairro a não cura dos males, por isso quase todos dizem que não são crentes!
Nesse diz que diz acontece que certas pessoas esqueceram-se do valor espiritual e acreditam tão-somente que não vale a pena lutar pelos bens do mundo, já que o mal toca-lhes sempre. Afirmam!
Porém há uma figura esquecida que todos os dias olha pelos canteiros de flores existentes em redor da pequena capela. Não raras vezes tem que reparar os estragos dos "revoltados", que vandalizam o minúsculo adro partindo tudo, grafitando as paredes de dizeres obscenos.
O Natal aproxima-se a passos largos e aquela figura encoberta pelo capote encardido, com receio que lhe estraguem o pequeno canto das sua orações, resolve fazer guarda noite e dia ao seu espaço de encontro com o invisível. Está tão habituado ao frio, como o frio ao homem que dorme ao relento, por isso o frio da noite, que quase o mata, sabe da sua existência, assim é, que não vai estranhar a sua presença e se calhar ainda lhe manda uma noite branca.
Na direita da capelinha encontra-se uma varanda um pouco mais larga e aconchegante do que aquelas a que está habituado. Por isso com a ajuda de um bidão a arder enganará o frio na incerteza da noite certa.
Naquela noite de 24 de Dezembro sentia o mundo como nunca, lembrava o passado amargo num murmuro de solidão do riso em passadas perras de cansaço, de onde o recanto da rua levanta chama, que aquece as mãos do defeito, num jornal que cobre a sua mancha humana.
O que sobra são tonalidades de um negro nocturno, são candeias de azeite seco na sua torcida, que se mistura com o coma de jornada adormecida.
Mesmo ali, os bidões continuam a arder, ali ele queima as suas origens, ali faz derreter o perfume da sua descendência, que o "espírito" hipnotiza em golfadas de Botelha, estaladas nuns lábios ásperos da equimose vontade de chegar perto da querida saudade.
Triste como a noite fala para as estrelas e diz-lhe! Os meus passos são como esmolas pedidas na avenida da Cavidade. Caminho clandestino num forçar de portas, sou eu e mais alguém desconhecidos da voz.

(E as estrelas respondem: caminha para além da claridade dos teus olhos, entrega ao incerto a tua sabedoria inconsciente e deixa-nos guiar o teu sonho, por uma viagem de gravidade e uma bela confusão de lágrimas de saudades e advinhas repletas de SIM)
Estão rotos os meus sapatos de tanta caminhada em singela "homenagem" ao peregrino desconhecido. O tempo já quase não conta os quilómetros da estrada, avizinha-se tempestade, águas calmas ou nada.
E então pensa. Sou velho com todas as letras, na senda do desmaio esqueci a dor do raio, a cor de Maio. Sou arcaico das minhas costas, sou a mensagem sem respostas. Ninguém me vê, sou apenas a sombra de uma pesada espécie, que de vez em quando recolhe a pena de ser "coitado" e logo adormece.
Triste como a vida que levava, lá adormeceu!
O momento que se seguiu foi em sonho que chegou até aos sentidos adormecidos do ancião.
Começou na voz. – (Entra cá para dentro enquanto eu fico de vigia! – E continuou: confia em mim esta noite nada de mal vai acontecer, nem aqui nem em lado algum!)
(Era uma voz misturada com cor e sabor a vento florido. Um som que lhe veio pelos flancos e se derramou pela sua alma como tempestade de estrelas na curva do seu sorriso quase escasso)
Logo fez o que a voz lhe pediu, acomodou-se num cantinho junto ao altar e por lá ficou protegido pela imagem gasta de um Cristo de pau de madeira.
Ao mesmo tempo que se intrigava sentia um estranho poder no som daquela voz de corpo invisível. Parecia-lhe tudo tão real dando-lhe a impressão que se encontrava em dois locais, mesmo que muito perto um do outro, parte dele debaixo da varanda vendo o bidão soltar um leve fumo misturado com a cor fogo alaranjada e a outra parte naquele cantinho junto ao altar.
A voz continuou! (- Hoje sou eu que vou cuidar dos teus canteiros de flores! Por isso descansa enquanto vou até lá fora humanizar aqueles que te ignoram.)
Algumas horas depois…

Passadas essas horas...

Na pequena claridade da janelinha penetra um raio, lá dentro um corpo deitado acorda estremunhado e abre uma pestana, e a seguir outra, lentamente volteia o olhar pelas paredes, aproxima os olhos do altar, incrédulo pergunta-se como veio parar dentro da capelinha? Como tinha o corpo quente sem sinal de frio algum? Mas numa paz como nunca experimentara tenta relembrar algo diferente naquela noite. Levanta-se e sem saber bem porquê logo se ajoelha perante o Cristo empobrecido perguntando-lhe. Como foi que eu aqui entrei? Como foi que me abriste aquela porta? Como vim parar cá dentro? Repete-se! Não respondes? Ou será que não tenho direito a questionar-te? Desisto!

O Silêncio respondeu! (- O chiar das tuas perguntas trouxe-te nada, apenas um silencio em redor da tua desistência. Desistes sem mesmo questionar ao soalho que te ajoelha, o porquê do seu formato e aos bancos de madeira, o porquê do seu cheiro a fé, esperança, amor e principalmente, a humildade da paciência.)
Levantou-se sem respostas e dirigiu-se para a porta fechada. De um momento para o outro a mesma porta escancarou-se sem alguém lhe tocar e num clarão que lhe incomodou a vista abriu-se na luz umas sombras de silhuetas. Do lado de lá do alçado três figuras envergonhadas olharam com receio para o homem que saía porta fora. E rogaram… (Pai, vimos pedir-te perdão e levar-te para casa! Falou o mais velho dos irmãos!)
(Foram esperanças mal amparadas, e deixadas ao relento que lhe iam aquecendo em noites de sussurros de neve e suaves trilhas sonoras dos cachos de ramos secos de uma pele desfigurada pela incapacidade de aquecer a face com um sorriso de real felicidade.)…Sem palavras o curvado ancião deixou cair algumas lágrimas, lembrou-se do sonho, viu os filhos, sentiu-lhe a sinceridade, levantou os olhos ao céu e perguntou. Será que devo? Só ele ouviu o que a voz que lhe disse. – (Vai para perto dos teus, que eu ficarei por aqui cuidando deste cantinho! Há… e sempre que possas vem cá visitar-me!…) O homem "novo"com um gesto de humildade anuiu que sim!
Para trás ficaram apenas as marcas das passadas em pontos negros fechados para sempre, numa porta aberta para novo caminhar. Olhou mais uma vez para a pequenina capelinha do "Bairro Do Fim Do Mundo" e pensou afirmando ao seu consciente. Serás sempre a minha segunda casa! Sorriu com a sua reflexão, para quem não tinha nenhuma de um momento para o outro ficar com duas casas, é brilhante! Este pensamento deixou-o muito feliz…E seguiu abraçado aos filhos na felicidade de o sonho de Natal na verdade acontecido!
(O Bairro do fim do mundo...revelou-se o destino final de seres prontos a aceitar sonhos e realidades desconexas e impostas pela lógica consciente. Foi na eminência de um sonho de Natal, que acreditei que o maior Milagre é a capacidade de fazer da vida uma grande obra de arte, em que o pincel, o martelo, o gesso, a tela, são as nossas esperanças envoltas em papel celofane e cobertas de cheiro de algodão doce.


PS. Este texto ganhou o primeiro prémio em “conto de Natal 2008 †promovido pela USAF (Universidade Sénior de Felgueiras)
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Goreti Dias
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« Responder #1 em: Dezembro 20, 2009, 20:46:25 »

E ganhou muito bem!
Bom Natal!
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Goretidias

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Dionísio Dinis
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« Responder #2 em: Novembro 20, 2014, 17:08:18 »

Uma escrita em tom maior. um talento de facto.
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Pensar amar-te, é ter o acto na palavra e o coração no corpo inteiro.
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Bom dia. Para todos um FigasAbraço
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Sejam bem vindos às escritas!
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Boa tarde!
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Bom Ano! Obrigada pela companhia!
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Entrei para desejar um novo ano carregado de inflação de coisas boas para todos
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Partilhar é bom! Partilhem leituras, comentários e amizades. Faz bem à alma.
Novembro 10, 2022, 20:30:23
E, se não for pedir muito, deixem um incentivo aos autores!
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Boas leituras!
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Boa noite!
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Brevemente, novidades por aqui!
Setembro 05, 2022, 13:38:48
Boa tarde
Outubro 14, 2021, 00:43:39
Obrigado, Administração, por avisar!
Setembro 14, 2021, 10:50:24
Bom dia. O site vai migrar para outra plataforma no dia 23 deste mês de setembro. Aconselha-se as pessoas a fazerem cópias de algum material que não tenham guardado em meios pessoais. Não está previsto perder-se nada, mas poderá acontecer. Obrigada.

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Boa noite feliz para todos
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Olá! Boas leituras e boas escritas!
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Boa noite a todos.
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Bom domingo para todos.
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Boa semana para todos.
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Boa tarde a todos.
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