Passarinheiros

[Oswaldo Eurico Rodrigues]

PASSARINHEIROS

   Minha rua é paralela à rua principal e transversal à rodovia. Portanto é rota de caminhantes fugindo de veículos. Se eu ficar parado no portão, perderei a conta de quantos homens passam com suas gaiolas de passarinho. Sempre achei muito engraçado ver aqueles marmanjos com seus bichinhos de dez ou quinze centímetros passeando. Nunca entendi porque gostam tanto desses pequenos seres. Acho isso tão estranho. Não seria melhor comprar um CD com os cantos das aves? Custaria muito menos e ainda teríamos os bichos soltos. Alegam não ser a mesma coisa um CD e um pássaro ao vivo. Perguntam pra mim se ouvir música em casa é a mesma coisa que ir a um show e ouvir o próprio cantor. Respondo não, mas digo serem situações diferentes porque o cantor está no palco por vontade própria. O pássaro não vai para a gaiola voluntariamente, mas sim violentamente é preso, embora bem alimentado e livre dos predadores naturais.
   Acho que tenho certa implicância com os passarinheiros não porque gostam de ouvir o canto das aves. Também gosto. Só que prefiro ouvir do pássaro solto. O ridículo contrastante dos grandalhões com os minúsculos penosos também não é o pior. O que realmente me apavora nos passarinheiros é o pavor deles pelos gatos. Gosto dos felinos e não entendo esse medo irracional. Os gatos não conseguem matar os pássaros assim tão facilmente e, se o fizessem, estariam apenas seguindo seus instintos carnívoros. Prender um pássaro não é um gesto natural da espécie humana, mas um hábito cultural questionável. Daí o meu protesto em favor dos bichanos.
   Resolvi escrever sobre isso agora, embora a antipatia seja bastante antiga. Remonta a infância quando ficava cansado de ver, num desenho animado, um pobre gato levando a fama de mau enquanto um passarinho cínico aprontava as piores vinganças. Ficção à parte, gatos passantes e pássaros gatunos passarão. A música passará? A vida passará? E os passarinhos?