CARTAS DE MALQUERER (Como te amo)

[António Casado]

António Casado__________30 Outubro 2009


CARTAS DE MALQUERER
(Como te amo)


De que adiantam as marés de dúvidas sobre quem és ou o que queres ser quando as minhas certezas são o vento que guardo no alforge do tempo com todas as questões que nunca ousei responder? Valerá a pena tanta meditação sobre o que nunca irás perceber quando eu próprio me vejo ao espelho e me desentendo? Que luzes febris impedem o teu sorriso se a ribalta da minha claridade está ofuscada pela dúvida? Amor não te lances nessa busca exaustiva como um garimpeiro procura ouro num rio árido pois os vendavais são apenas construídos de ventanias e chuvas e a própria terra não os questiona mas aproveita deles o néctar que lhes dá vida!
Estou exausto, sim. Sinto o álcool amordaçar-me a mente e apetece-me dormir. Dormir só… Sempre só! Exausto por me repartir entre o querer ser o maior amigo que o maior amigo e o amante mais que perfeito cuja compreensão exceda os limites da velocidade da luz e a enorme intolerância de não querer saber nada de nós. Pois bem aqui me tens! Quando vieres encontrarás um sorriso estrelado à porta da minha compreensiva atitude carinhosa a bem dizer a tua chegada e a amaldiçoar a tua partida com a garantia de estar sempre ao teu lado.
Estou exausto, amor. Na minha vida já não cabe uma sombra. A euforia da nossa cama desagua num estendal de uísque disposto ao redor do pesadelo que não quero ter. Estou exausto e nem consigo pensar. Nem te quero neste preciso momento! Sei que não estás, não virás e nem te quero! E se viesses? Talvez a vontade voltasse e a culpa por ter adormecido dentro de um copo de vidro me estrangulasse consciente de que perderia a real noção dos escassos minutos do teu calor.
Sei que estás confuso… Deixa! Também estou confuso e nunca declinei perante o amor que te tenho. Compreendo que também me ames como disseste naquela calorosa noite depois de amarmos à luz das estrelas e do fôlego ter apagado outros discursos. Apesar de na tua vida caber o projéctil de mais alguém, isso não me fere. Nem as distâncias… Nem as certezas de uma derrota comprada ao futuro… Nem a noção clara de um sentimento que dispersa na necessidade de nos termos, nos amarmos e sermos felizes. Seria bom demais que concluísses que não presto. Assim de uma forma simples reunirias as facas e projectarias no espaço o cúmulo das dores. Passaria… Tudo passa! Talvez numa brecha deixada ao acaso um ou outro suspiro se aconchegasse ao meu ouvido e “amo-te” fossem cantos de pardais…
Sei amor. Não posso ser amado por ninguém, excepto por ti, mesmo quando o travesseiro me insulta e o teu cheiro impregnado no meu lençol me masturba. Claro que não te trairia! Acaso poderei trair-te? Para te trair terias de ser meu… És meu? Respondes que um dia… qualquer dia… quando todos os abutres do mundo estiverem poisados no galho de uma solução. Qual solução? Acaso tens para nós uma solução? Penso que tens razão. Digo-te: “Cuidado! Quando partires só precisas dizer-me se vais para ficar ou se voltas…” Sorris-me… Nem uma coisa nem outra!
Amor acredita, eu não presto! Sou teimoso ao ponto de exigir que os jardins sejam sempre verdes! Sou frio ao ponto de na mais desastrosa invernia nos destapar e de braços abertos à loucura voar pelo teu corpo à procura de calor. Sou louco ao ponto de jurar no cimo duma torre que te amo amando-te mesmo! Como vês não presto! O mais triste é dizeres-me que fui o teu primeiro homem como se as desculpas para as dores se justificassem com a hipotética virgindade. Eu só queria paz! Porque me seduziste? Porque te entregaste? Porque me tomaste nos braços? Porque me beijaste? Porque permitiste que provasse o mel dos teus lábios? Sabias que eu era tanto como tu…
Exausto… Acredito que te reveles e que um dia sejas meu! Por isso te espero. Por cada vinda planto uma árvore. As maçãs do paraíso são colhidas pelas minhas mãos sedentas de pecado e mordo-as na fina pele dos teus lóbulos rubros. A tua ausência corrói-me… queria que nunca mais viesses… Depois correria para os teus braços quando um trovão em forma de suspiro levedasse no ar a minha pele. De manhã, todas as manhãs, aqueceria o pão no forno da paixão e saberia que a teu lado o mundo seria apenas uma extensão de nós!


Para Pedro Vidal