HOMOAFECTIVO 2

[António Casado]

António Casado__________22 Julho 2008





HOMOAFECTIVO
2



É tão fácil insultar o mundo!

Atiro culpas como quem cospe pedras!
Exibo os pés sangrados! Protesto!
Arranco aos olhos as lágrimas
Na solidão do meu deserto!

É tão fácil apontar o dedo!

Ergo braço! Reivindico a mão decepada!
Arremesso dardos e flechas
Para justificar um fim!
Acuso os pássaros dos ais
Que as dores soltam
Da garganta degolada!

…Apenas
Para não ver no espelho
A cansada imagem de mim

Porque limitei a coragem à inércia?
Porque construí
Os claustros do meu isolamento?
Porque fui o operário do meu tormento?
Porquê? Nem sei…

Sei
Que diante do amor
Diante da paixão
Como covarde
Recuei

Quem esperou por mim
Na curva de um impulso
Que abrisse as portas
A uma vida em comum?
Quem se deitou
Sobre a minha sombra
À espera de consolo?
Quem?!

Nem um sinal, uma palavra, um olhar
Algo que me fizesse acreditar que o amor era possível
Ribombaram nos céus em forma de trovão…
Nem o vento escreveu na areia da praia
Um nome… Apenas um nome… O nome…

Quem me esperou?
Ninguém…

Para quê então erguer o rosto
Fixar-me num céu sem reflexo
Afirmar diante de mim:
- Sou gay.

Iguais… Todos foram iguais…
Machos de um mundo homem!
Beijaram-me os lábios na cama
Apertaram-me as mãos na rua
Arderam comigo na mesma chama
Devoraram-me a pele nua
Tudo em mim os excitava
Tudo lhes dava prazer

Nas praças da cidade
Consumiam a mesma falsa ansiedade
Com o olhar suspenso
No corpo de uma mulher

Amarroto o ciúme
Sobre os lençóis suados
Na confusão de todos esses corpos…
Nesta agonia
Neste lume
Inflamo no amor que não tive
Nem sei

Olho-me ao espelho:
- Porque sou gay?


Registado IGAC 4791/2011 10-10-11
Trabalho AMOR IMPERFEITO

[Goreti Dias]

A isso ninguém saberá responder. Eu apenas sei que constrói belas linhas de versos bem trabalhados.