Crónica de uma manhã sem sol

[Maria Gabriela de Sá]

       Enquanto espero pelo sol, hoje metido entre as nuvens não sei em que orgias, lembro-me de Adriano, nesta hora antes do almoço. Não sei ainda se vai ser uma frugal salada, com um engano dentro como se fosse uma sande, talvez um ovo cozido, ou se voltarei a comer um peixe sucessivo, visto que ontem delapidei à garfada e sofreguidão um carapau grelhado com molho verde.

       Vim de uma caminhada, por entre as matas perfumadas de eucalipto e outras fragâncias. Talvez tenha queimado 5 calorias, e uma salada traz, à partida, a garantia de não encorajar as que ainda persistirem onde não devem a continuarem por lá, se entretanto não as reforçar com um mimo avantajado em açúcar, gordura ou outras substâncias habituadas a ocuparem espaço indesejado em corpo de mulher.

        E Adriano?
        O imperador dizia que, apesar de também promover os obscenos banquetes, tão aprazíveis aos lascivos romanos, era sobretudo por uma questão social, ele que às vezes se sentia entediado até ao vómito com tanta orgia e devassidão protagonizadas pela Deusa Diana e pelo perverso Baco. A ponto de preferir morrer na tenda da campanha, durante as batalhas, só para não submeter as vísceras ao odor da carne e outros cheiros.

       O sol não tem tido, até agora,  força para emergir dos panos cinzentos onde hoje se embrulhou com as nuvens. E eu, se penso no dourado da minha pele depois de me submeter aos seus longos raios, bem posso tirar daí o sentido e dedicar-me a lazer que não o tenha como protagonista. É melhor encerrar a praia e ir até ao campo ouvir os passarinhos, os grilos e toda a festa da natureza, embora esteja proibida por lei de lá assar sardinhas para o meu almoço.

       Vou-me à salada, ao verde da alface e ao vermelho das cerejas. A seguir, vou também registar o euromilhões com que, às terças e sextas-feiras, se coloram (juro que não sei se este tempo de verbo existe… ou se preciso de aderir ao novo acordo ortográfico …) os meus e os sonhos de muito boa gente que ainda não tenha morrido na desesperança de ser rica um dia.

[Goreti Dias]

Que coincidência! Também vou jogar no euromilhões, mas antes deixa-me acabar com as cerejas. Ainda restam ali algumas...
Mas aqui tenho sol! Está um calor que nem te conto para não fazer inveja!

[Maria Gabriela de Sá]

O sol leu o meu apelo e ouviu as minhas preces. Conseguiu romper as brumas do nevoeiro e a reticência das nuvens,  instalando-se com um pouco de vento no meu terraço. Um aquecia e outro abanava, enquanto eu a pele dourava e rima em escrita deixava.

Abraço

[Nação Valente]

Com nuvens a sacar-nos o sol, sabe-se lá para quê. Com carapaus e alfaces em tête-a-tête. Com gorduras devoradas por esfomeadas calorias. Com Adriano em versão império dos sentidos, cerejas, passarinhos e outros miminhos, nunca se deve abandonar a esperança de um dia casar com a riqueza. Entretanto delicio-me com este pitéu literário.

Abraço

[Maria Gabriela de Sá]

Com nuvens a sacar-nos o sol, sabe-se lá para quê. Com carapaus e alfaces em tête-a-tête. Com gorduras devoradas por esfomeadas calorias. Com Adriano em versão império dos sentidos, cerejas, passarinhos e outros miminhos, nunca se deve abandonar a esperança de um dia casar com a riqueza. Entretanto delicio-me com este pitéu literário.

Abraço

Obrigada, Nação Valente, Abraço