Figas de Saint Pierre de
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« em: Julho 13, 2015, 10:10:22 » |
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FALTA DI MENTE A viagem, de avião, correra bem até o Sal, onde na transferência para São Vicente, à bagagem que levava Nani agregou uma encomenda especial ; eram quatro lagostas, que foram a tempo de ser o primeiro almoço, em casa dum amigo, como embaixadoras gastronómicas do marisco cabo-verdiano. Que maravilha! Ali, bem empratadas, estavam elas. Os olhos de quem as via ficavam glutões, com armas de desejos de começarem o assalto ao prato. Por outro lado, por uma questão de cortesia, aquelas duas lagostas, separadas das outras duas irmãs, que ficaram no frigorÃfico, pareciam radiantes, felizes, por serem comidas por tão ilustres visitantes! Até pareciam dizer: -“Comei-nos. Comei-nos depressa, depressaâ€. Depressa não, mas sim saboreadas, lentamente, em lento strip-tease, até que mais devagar, mais devagar, porque já a enfartar! Ainda sobrou lagosta daquelas duas, que derrotaram a fome dos quatros guerreiros, chegados esfomeados nos olhos, mas não tanto de barriga! Depois da lagostada, armaram-se em turistas pelas ruas de São Vicente, para um passeio digestivo, olhando a baÃa do porto de São Vicente até que:, “ Ó Nani. Naniâ€, ouviu-se! Quem chamava? Quem seria? Era uma amigo do Nani, inserido numa equipa de cooperação portuguesa, num programa de desenvolvimento das pescas cabo-verdianas. -“Que estão a qui a fazer? -“Viemos aqui, passar uns dias. -“Estão num hotel? -“Não. Em casa dum amigo, onde já comemos lagosta, até fartar. SaÃmos para fazer a digestão e conhecer um pouco a cidade†-“Vou-vos arranjar uma visita à Santão Antão. Só há duas horas de telefone por dia. Há um ferry que faz a ligação para Santo Antão. Arranjo-vos bilhetes. Se eu não conseguir contatar a empresa das pescas, vocês, depois do desembarque, encontram uma Peugeot 309, de caixa aberta, que está lá sempre à espera do nosso correio. Caso não consiga telefonar, eu dou-vos uma credencial e entregam a carta a condutor, um negro, que ficará por vossa conta, só lhe pagam o comer! Pode ser para amanhã?†-“Mas, ainda agora chegamos! -“Aproveitem. Amanhã pode ser, depois não garanto. Lagostas ao almoço! Oferta de excursão a Santo Antão! Sentados à volta duma mesa dum café, depois de amena conversa, de matar saudades, Nani e seus amigos disseram que sim, recebendo a credencial e todas as informações sobre a visita a Santo Antão. No outro dia, embarcaram no ferry, oferecido pelos alemães. Depois de zarpado, das mansas águas do Mindelo, o que chamava a atenção eram os baldes de plástico espalhados pelo salão dos passageiros! O ferry prosseguia seu rumo, entrando lentamente no mar alto, apanhando Nani, mesmo no extremo da proa, avistando os pequenos barcos, motorizados com motores japoneses, pagos com dinheiros noruegueses, e ensinados por portugueses a pescar com novas técnicas. As ondas, cada vez mais alterosas, e entre elas, dançavam pequenos barcos de pesca, desaparecendo, momentaneamente, ressurreicionando, pouco depois, os seus dois tripulantes nos seus coletes amarelos, saudando o ferry. As primeiras vagas chapinavam o Nani, que para os pescadores parecia estranho sereio,que, ali, agarrado ao mastro da proa se mantinha firme na travessia, porém, cada vez mais encharcado com as saudações aquáticas das ondas que começavam a lamber o convés, sob o olhar do capitão do ferry, que deveria pensar: -“Aquele gajo não regula bem dos miolos! Alguns passageiros, que estavam na amurada do convés regressaram ao salão de passageiros enquanto era tempo. Alguns negros comentavam que aquele branco, ali a apanhar banho das ondas, por já não ser seguro regressar ao salão, teria “falta di menteâ€! Só depois de ter passado o sobressalto do mar alto, e terá apanhado um navegar mais macio, é que Nani, todo encharcado, entrou no salão para passageiros e viu para que tinha servido os baldes, cheios de “souvenirs gastronómicosâ€; mariscadas fermentadas vindas de São Vicente. Desembarcados, no cais lá estava a Peugeot 309, de caixa aberta, a quem o Nani e amigos se dirigiram. Felizmente, o telefone tinha funcionado. O negro, condutor, já sabia da nossa chegada e logo pronto para os levar ao outro lado da Ilha, que segundo o amigo do Mindelo tinha motivos de interesse a visitar; o dedo de Deus e as Fontainhas. O porto, onde chegou o Ferry, era no lado mais pobre, mais árido, mais seco da ilha, vergastada e erodida por fortes ventos, onde a sobrevivência de que qualquer árvore era quase um milagre. O nosso condutor, a quem já tÃnhamos pago o almoço, cachupa rica, era simpático e informava que o outro lado a ilhar era diferente, ou seja dum lado era quase que um deserto, do outro quase uma selva! Quando perguntado sobre as estradas em Santo Antão, o nosso amigo de São Vicente, disse que as “estradas eram más, mas que os condutores eram muito bons! Os maus já tinham morrido todosâ€. Esclarecedor. Estávamos vivos! Aos solavancos numa quase picada, pouco mais larga do que a Peugeot! Aqui e ali uma baia para encostar e deixar outro carro passar! O passageiro, ao lado do condutor, era olho na picada e olho no mar, cem metros lá em baixo! Cinquenta centÃmetros de sobra da largura da estrada faziam a diferença entre o rodar e o voara sobre o mar! Já no vale de Santo Antão, quatro kilómetros de extensão, nele cultura de cana de açucar, cujos donos pertenciam à classe polÃtica dominante no Arquipélago . Uma paragem, num engenho de cana, a caminho do dedo de Deus, deu para uma doce conversa com meia-dúzia de trabalhadores, metendo cana entre rolos dum cilindro feito na fundição de Massarelos, no Porto, puxado por um burro, talvez , quem sabe? se emigrado, de Miranda do Douro . Nani e amigos viram as dezasseis pipas, cheias de grogue, no seu processo de fermentação. Uns goles de grogue foram tragados por Nani e companhia, em estilo de prova de vinhos! Tinham que mostrarclasse. Quem sabe se aquele lote de grogues não fosse certificado com o rótulo: “Certificado por Nani e Cª, a caminho do dedo de Deusâ€. Além do engenho, o dedo de Deus também pertencia ao mesmo dono, um ministro de Estado. No percurso, a caminho do dedo, a estrada deixava de ser estrada, nem picada era, sim amontoado de calhaus, impedindo que a Peugeot progredisse, ficando estacionada, então, os turistas regressaram à primitiva e ancestral posição de Homo erectus, e assim, a penates, caminharam até ao dedo de Deus; formação rochosa, apontando bem ao alto, talvez para fazer cócegas à s nuvens para chover sobre a ilha, e torna-la mais fértil! Uma negra, a quem tinham dado boleia, dizia que comida de panela é que era boa, não só banana e papaia! Toda excursão daqueles quatro brancos, ali, numa Peugeot 309, conduzida por um negro, tinha despertado a curiosidade da população do vale, onde não se passava quase nada além do adejar da cana ao vento! Alcondorado, num ponto elevado, um negro, dava gritos, como Ãndio dando alarme sobre a chegada de caras pálidas, mas o ambiente era pacÃfico, pois que os goles de grogue, antes tomados no engenho da cana, tinham sido como que fumar o cachimbo da paz! porém, aqui entra, outra vez , o “falta di mente†A mulher do Nani usava socas brancas, ortopédicas, e eis que no regresso do dedo de Deus, a caminho da Peugeot, os turistas foram a surpreendidos pelo negro, que na ida estava lá no alto, a gritar, mas que tinha descido, e a correr deu em cima da branca esposa do Nani, gritando: -“Sapato é meu†“Sapato é meu â€. Os outros negros, presenciando a cena não querendo criar um incidente diplomático, logo acudiram a segurar quem queria roubar as lindas socas de branca, dizendo: -“Disculpem, tem falta di menteâ€. -“Disculpemem, falta di mente†-“Não regula bem da cabeça†diziam os brancos. “Tem falta di menteâ€, diziam os negros Até que um negro, bem falante, que parecia ter rudimentares conhecimentos de medicina, informou que um branco, antes, já tinha recomendado para o doente tomar mentol ou chupar rebuçados de menta, mas que os rebuçados tinha acabado! Como prova de compreensão, Nani, que tinha mostrado “falta di mente†quando se agarrou ao mastro da proa do ferry, deu uma nota de quinhentos escudos aos familiares do doente, para rebuçados de menta. “Que falta di mente!â€.
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