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Autor Tópico: Fernando Pessoa_Ãlvaro de Campos  (Lida 1632 vezes)
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Dionísio Dinis
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« em: Julho 04, 2008, 23:38:02 »

Ãlvaro de Campos
 
Se te Queres
 
    Se te queres matar, por que não te queres matar?
    Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
    Se ousasse matar-me, também me mataria...
    Ah, se ousares, ousa!
    De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas
    A que chamamos o mundo?
    A cinematografia das horas representadas
    Por atores de convenções e poses determinadas,
    O circo policromo do nosso dinamismo sem fím?
    De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
    Talvez, matando-te, o conheças finalmente...
    Talvez, acabando, comeces...
    E, de qualquer forma, se te cansa seres,
    Ah, cansa-te nobremente,
    E não cantes, como eu, a vida por bebedeira,
    Não saúdes como eu a morte em literatura!

    Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente!
    Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém...
    Sem ti correrá tudo sem ti.
    Talvez seja pior para outros existires que matares-te...
    Talvez peses mais durando, que deixando de durar...

    A mágoa dos outros?... Tens remorso adiantado
    De que te chorem?
    Descansa: pouco te chorarão...
    O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
    Quando não são de coisas nossas,
    Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
    Porque é coisa depois da qual nada acontece aos outros...

    Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda
    Do mistério e da falta da tua vida falada...
    Depois o horror do caixão visível e material,
    E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.
    Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,
    Lamentando a pena de teres morrido,
    E tu mera causa ocasional daquela carpidação,
    Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...
    Muito mais morto aqui que calculas,
    Mesmo que estejas muito mais vivo além...
    Depois a trágica retirada para o jazigo ou a cova,
    E depois o princípio da morte da tua memória.
    Há primeiro em todos um alívio
    Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...
    Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
    E a vida de todos os dias retoma o seu dia...

    Depois, lentamente esqueceste.
    Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
    Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste.
    Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
    Duas vezes no ano pensam em ti.
    Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
    E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.

    Encara-te a frio, e encara a frio o que somos...
    Se queres matar-te, mata-te...
    Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência! ...
    Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida?

    Que escrúpulos químicos tem o impulso que gera
    As seivas, e a circulação do sangue, e o amor?

    Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida?
    Ah,  pobre vaidade de carne e osso chamada homem.
    Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?

    És importante para ti, porque é a ti que te sentes.
    És tudo para ti, porque para ti és o universo,
    E o próprio universo e os outros
    Satélites da tua subjetividade objetiva.
    És importante para ti porque só tu és importante para ti. 
    E se és assim, ó mito, não serão os outros assim? 

    Tens, como Hamlet, o pavor do desconhecido?
    Mas o que é conhecido?  O que é que tu conheces,
    Para que chames desconhecido a qualquer coisa em especial?

    Tens, como Falstaff, o amor gorduroso da vida?
    Se assim a amas materialmente, ama-a ainda mais materialmente,
    Torna-te parte carnal da terra e das coisas!
    Dispersa-te, sistema físico-químico
    De células noturnamente conscientes
    Pela noturna consciência da inconsciência dos corpos,
    Pelo grande cobertor não-cobrindo-nada das aparências,
    Pela relva e a erva da proliferação dos seres,
    Pela névoa atômica das coisas,
    Pelas paredes turbihonantes
    Do vácuo dinâmico do mundo...
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Pensar amar-te, é ter o acto na palavra e o coração no corpo inteiro.
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Bom dia. Para todos um FigasAbraço
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Sejam bem vindos às escritas!
Agosto 14, 2023, 16:52:48
Boa tarde!
Janeiro 01, 2023, 20:15:54
Bom Ano! Obrigada pela companhia!
Dezembro 30, 2022, 19:42:00
Entrei para desejar um novo ano carregado de inflação de coisas boas para todos
Novembro 10, 2022, 20:31:07
Partilhar é bom! Partilhem leituras, comentários e amizades. Faz bem à alma.
Novembro 10, 2022, 20:30:23
E, se não for pedir muito, deixem um incentivo aos autores!
Novembro 10, 2022, 20:29:22
Boas leituras!
Novembro 10, 2022, 20:29:08
Boa noite!
Setembro 05, 2022, 13:39:27
Brevemente, novidades por aqui!
Setembro 05, 2022, 13:38:48
Boa tarde
Outubro 14, 2021, 00:43:39
Obrigado, Administração, por avisar!
Setembro 14, 2021, 10:50:24
Bom dia. O site vai migrar para outra plataforma no dia 23 deste mês de setembro. Aconselha-se as pessoas a fazerem cópias de algum material que não tenham guardado em meios pessoais. Não está previsto perder-se nada, mas poderá acontecer. Obrigada.

Maio 10, 2021, 20:44:46
Boa noite feliz para todos
Maio 07, 2021, 15:30:47
Olá! Boas leituras e boas escritas!
Abril 12, 2021, 19:05:45
Boa noite a todos.
Abril 04, 2021, 17:43:19
Bom domingo para todos.
Março 29, 2021, 18:06:30
Boa semana para todos.
Março 27, 2021, 16:58:55
Boa tarde a todos.
Março 25, 2021, 20:24:17
Boia noite para todos.
Março 22, 2021, 20:50:10
Boa noite feliz para todos.
Março 17, 2021, 15:04:15
Boa tarde a todos.
Março 16, 2021, 12:35:25
Olá para todos!
Março 13, 2021, 17:52:36
Olá para todos!
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Boa feliz noite para todos.
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Bom fim de semana para todos
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Boa quinta para todos.
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Boa noite para todos.
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Boa noite feliz para todos.
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Bom domingo para todos.
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