Nina Araujo
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« em: Setembro 12, 2008, 11:54:18 » |
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Desde pequenos, eu e meu mano Beto (que lá do céu deve lembrar) nos acostumamos a ouvir papai contando aqueles causos coloridos de seu sertão paraibano, havia um que me divertia em especial. Era assim... Por aquelas bandas, era preciso se precaver contra as aves grandes que prejudicavam a plantação dos roçados, pois então, seu Mané Pequeno fez o espantalho mais bonito que podia, caprichou no traje, o tronco era de madeira boa e os detalhes ficaram tão bons que ele lhe dera o nome de Marcolino, só faltava falar o boneco vestido de gente... Assim foi por muito tempo, até que Deus mandou toda a chuva que os homens pediram aos santos e, a água lambeu tudo e varou a cerca levando o Marcolino do Arroz pelo rio afora, até fazer curva e parar na fazenda de seu Tico Lunda, na região de baixo, onde o pobre ficou grudado em pé num pau forte de cerca. Certa noite, passado alguns dias quando tudo já havia secado e a vida normalizava, apareceu por lá nas terras do fazendeiro Tico, um caçador afoito atrás de uma onça braba. Cartucheira em punho, o homem pulou a cerca, quando ouviu a voz: -Larga essa vida,Bastião!Senão tu vai é morrer! O homem deu um pinote e caiu de cócoras rente a imagem impassÃvel em pé na cerca, o olhar parecia um tição. -Nhô sim,vixê,o sinhô é um santo,é? Ele jura que o santo repetiu a frase mais duas vezes com voz de trovão, foi então que abaixou o olhar, tirou o chapéu contrito e ficou num colóquio de duas horas com o divino. No fim, fez o juramento de deixar aquela vida aventureira quem sabe até virasse um beato...O que se sabe é que ele contou o ocorrido para a cidade todinha e estava feliz com a conversão. Já de manhã muitos iam e vinham como em romaria para ficar Ãntimo do santinho que sem parcimônia espalhava suas graças. Seu Tico não teve outro jeito senão construir um lugar onde os romeiros pudessem deixar seus agradecimentos, era perna de cera, cabeça, até uma bicicleta... A cidade acolhia bem aquele que passou a ser o "santinho do rio". A mulher de seu Mané Pequeno combinara com as comadres de ir até a tal fazenda conseguir seu milagre, já que o santinho dava plantão, acompanhou-a seu filho mais novo, rapaz esperto como o quê... Lá chegando, as mulheres ajoelhadas permaneciam por muito tempo, rezando e chorando, chorando e rezando...até que algo chamou a atenção do rapazote, ele se aproximou do santo, tocou sua mão de madeira e deu o grito: -Vixê, este aqui é Marcolino, ele tá sem o dedo! É Marcolino! É Marcolino! A mãe ainda chorosa correu até o filho que lhe relatou a descoberta mas antes que terminasse recebeu um croque tão forte que saiu fogo do olho. Nem é preciso dizer do burburinho que aquilo causou, mandaram chamar seu Mané que apeou já com o cinto nas mãos para dar uma pisa no rapazinho que implorava ao pai: -Meu pai, este danado é Marcolino do Arroz, veja o dedo dele que o sinhô cortou, veja... O velho foi conferir e era mesmo um milagre grande, achara o Marcolino, tanto tempo perdido! Depois de recolher o santinho do pau talhado, retornaram todos aos seus afazeres,felizes e um pouco atônitos.Mas a multidão se dispersou satisfeita e cantante. E quanto aos milagres? Bem, eles sempre existiram no sertão e nos corações dos simples, não é não?
Nina Araújo
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