Antonio
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« em: Novembro 08, 2007, 22:11:04 » |
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Gilberto Silveira era um médio empresário com cerca de quarenta anos, tinha um filho que vivia com a ex-mulher, era de estatura e compleição mediana, figura simpática e com um rosto arredondado donde sobressaÃam uns olhos grandes e vivos, muito escuros. Há uns tempos que costumava ir, depois de jantar, até um pequeno bar na zona velha da pequena cidade onde vivia. Uma noite sentou-se ao balcão, como de costume, e pediu o habitual: um café e um whisky simples. Pouco depois sentou-se junto dele, com um banco de intervalo, uma mulher vistosa, elegante, de cabelos loiros e pele branca. Aparentava uns trinta anos e aquela cara bonita não era estranha ao Gilberto. Usava óculos escuros, mesmo naquele inverno, que lhe ficavam muito bem. - Desculpe! Posso sentar-me neste banco? – perguntou ele à desconhecida enquanto se adiantava e ocupava o assento ao lado da jovem mulher. - Com certeza! – respondeu ela com um sorriso sedutor. - Não a conheço! Mas a sua cara não me é estranha... - É natural! Eu vivo aqui e o senhor provavelmente também. Já nos devemos ter cruzado – disse ela. - Pois! Deve ser isso. Fez uma pausa e continuou, o Gilberto: - É a primeira vez que vem a este bar? - Sim! Começava a estar farta de estar em casa à noite, mesmo com a companhia da TV e da Internet – e deu uma risada discreta. - Mas que solidão! – exclamou o Silveira, não podendo esconder algum entusiasmo. Conversaram mais um pouco e, a convite do homem, depois foram sentar-se numa mesa. Não tardou muito que Gisela Brito, assim se chamava a mulher, dissesse: - Tenho de me ir embora! Amanhã entro à s oito e meia no emprego. - Quer que a leve a casa? A noite está feia – ofereceu ele os seus préstimos, solÃcito. - Não, muito obrigado! Tenho carro e não bebi álcool – e levantou-se. - Obrigado pela sua companhia. Gostei muito de conversar consigo – disse o Silveira. - Eu também! - Olhe que já está pago! – informou ele. - Sim? MuitÃssimo obrigado. Amanhã venho cá de novo para me pagar outro café – disse a mulher ao mesmo tempo que soltava uma gargalhada cristalina. E retirou-se. Na noite seguinte lá se encontraram de novo e assim foi durante mais uns dias até que ela, finalmente, aceitou um convite do homem para darem uma volta. - Amanhã o meu chefe está fora e dispensou-me durante a manhã – justificou-se a Gisela. SaÃram ao mesmo tempo, como já tinham feito algumas vezes, e ela disse que iria pôr primeiro o carro a casa. O Silveira anuiu e segui-a até que ela voltou da garagem do prédio que habitava e entrou no automóvel dele, bem encapuçada pois chovia bastante. Foram até um miradouro que ficava num ponto alto na periferia da urbe e onde costumavam parar alguns carros com casais. Ele estacionou. Só mais um automóvel lá estava. - Agora não chove! Vou ver a vista! Gosto muito de olhar lá para baixo, quer de dia quer de noite – e saiu do carro, a jovem. Ele fez o mesmo. Aproximou-se da loira, pegou-lhe na mão e beijou-a. Depois abraçou-a e colou a boca à dela. Eis que lhe prenderam as mãos atrás das costas e lhe colaram um adesivo largo na boca. Eram dois vultos, com silhueta de homem, que haviam saÃdo do carro que lá estava parado. Entretanto, chegou e parou no local um jeep da GNR e de lá saiu um soldado que se aproximou do grupo sem nada dizer. A Gisela falou, então: - Gilberto! Vais pagar caro por teres estragado o casamento da minha irmã, tê-la feito divorciar-se com promessas doiradas e depois despediste-a e abandonaste-a. Levaste-a ao suicÃdio. Isso não se faz a um Castro. Sim! Porque o meu verdadeiro nome é Susana Castro. Eu vivia noutra cidade mas mudei-me para aqui porque a queria vingar, meu sacana! E chegou o momento! Um dos homens encostou algodão embebido em éter no nariz do Gilberto que perdeu a consciência. Desamarram-no e, enquanto dois deles o levavam, um pegando pelos pés outro por baixo dos ombros, pela estrada descendente do miradouro, a Susana Ãa colocando mais do volátil lÃquido na vÃtima e o guarda guiou o carro para uma berma junto de um profundo e abrupto precipÃcio. Meteram o empresário no veÃculo e empurraram-no para o abismo. ImpossÃvel escapar com vida! O plano tinha sido urdido pelos três com a maior minúcia. O soldado fora aliciado depois. A noite chuvosa apagaria algumas marcas que ficassem no chão da zona do miradouro. Mas havia alguns riscos que era preciso neutralizar: Alguém poderia ter visto o Silveira e a Susana saÃrem juntos do bar ou mesmo da casa dela. Mas esse estaria resolvido facilmente pois um dos assassinos era também irmão das mulheres e ao mesmo tempo chefe do posto da GNR. Assim, o José Castro estaria a par de qualquer denúncia e neutralizava-a. Um terceiro elemento era um seu subordinado que, em tempos, tinha feito um roubo de dinheiro no posto e que fora descoberto pelo chefe; mas este ocultou o facto guardando contudo as provas e ficando, deste modo, com o Joaquim nas suas mãos. O Manuel, o quarto elemento, era o antigo marido da mana suicida, a Clara. Outro risco era estarem mais viaturas no miradouro. Mas, pouco antes do crime, o jeep da GNR tinha passado por lá e dado ordem para se retirar ao condutor da única que estava estacionada com um parzinho. Entretanto, e muito naturalmente, o Gilberto Silveira não voltou a ser visto, o que levou o seu filho e a ex-mulher a deram parte do desaparecimento na GNR. Mas também o fizeram na PolÃcia Judiciária de uma cidade próxima já que naquela não existia nenhuma delegação O José Castro foi encarregue de ajudar a PJ na descoberta da causa do misterioso desaparecimento. Passam-se várias semanas e nada se descobriu. A vida da pacata cidade que ainda há poucos anos era uma vila, agitada durante os primeiros tempos após a notÃcia, voltou à normalidade. Teria sido cometido o crime perfeito? O inspector Emanuel Vargas da PJ, encarregue do caso, já estava mais preocupado a desvendar outros mistérios quando, numa tarde de primavera, recebeu um telefonema: - Queria dizer que eu sei quem matou o Gilberto Silveira – falou uma voz de homem. - Sim? E quem fala? - Isso não lhe posso dizer. Eu sou uma pessoa conhecida na cidade e não quero que os outros saibam do meu vÃcio de espreitar para dentro dos carros com casais – confessou a nova personagem. O inspector sorriu, fez um sinal a um agente que estava perto dele e disse: - Mas pode dizer-me os pormenores? - Posso, porque eu estava escondido e vi tudo. Sei quem são os quatro assassinos – respondeu o “voyeurâ€. - Quatro? Então era importante que passasse por aqui para prestar depoimento. Ou nós vamos falar consigo. Como prefere? – sugeriu o inspector. - Digo-lhe pelo telefone – respondeu o outro. - Pode dizer! Mas se não prestar depoimento não podemos incriminar os homicidas – disse o homem da Judiciária. - E podem dar-me garantias de que o meu vÃcio não será descoberto pela gente da terra? - Podemos! Basta arranjar um outro pretexto para lá ter estado. Consegue? – inquiriu o policial. - Claro que não! Caso contrário já teria revelado o que sei há muito tempo. - Bom! Depois pensamos nisso. Conte-me o que observou, por favor – pediu o Vargas enquanto viu o agente a levantar o polegar em sinal de que tudo estava bem. E o denunciante contou tudo com muito rigor. Tinha reconhecido a vÃtima, os dois agentes da autoridade e o ex-marido da suicida. A mulher só descobriu quem era quando ela fez o discurso de despedida para o empresário. Indicou ainda a matrÃcula dos dois carros e do jeep, que anotara. Enfim! A solução do enigma da morte do Gilberto Silveira estava ali, como que caÃda do céu. - Depois temos de inventar uma história para que o seu vÃcio não seja descoberto. Pode contactar comigo amanhã? – disse o satisfeito inspector. - Sim! Mas porquê? - Porque não me deu o seu contacto, pois não? - Nem dou! Está bem! Eu telefono. - Então até amanhã e obrigado – despediu-se o Emanuel Vargas. Desligou e perguntou ao colaborador com quem trocara sinais durante o telefonema: - Segundo percebi localizaste a chamada. Eu fiz a gravação. De qualquer modo mandei-o telefonar amanhã. E é preciso confirmar a veracidade das afirmações, começando por localizar a viatura e o cadáver. - Sim inspector. Tem aqui o número do telefone utilizado. Até já sabemos onde está. É de uma casa comercial, a Casa Santos. - O “pestaninha†pensava que era muito esperto – disse sorrindo o inspector. E continuou: - Mas se os criminosos confessarem nem precisa de depor. Pode ser que tenha sorte. E virando-se para outro agente: - Prepare os seus homens porque vamos imediatamente sair. Eu dou-lhe já mais detalhes. Mas só no dia seguinte o carro foi descoberto com o cadáver lá dentro e os criminosos foram presos com grande espanto e alvoroço da populaça. O comerciante Ãlvaro Santos, homem dos seus cinquenta e tantos anos, muito conhecido na cidade, solteirão, viu entrar um homem pelo seu estabelecimento. - Senhor Santos! PodÃamos falar um bocadinho? – pediu baixinho o Vargas. - Sim! Venha ao meu escritório. – respondeu o mirone – É o senhor inspector, não é? O outro fez um sinal afirmativo com a cabeça. Entraram, fecharam a porta e disse o homem da PJ: - Quero agradecer toda a sua colaboração. Já temos algumas confissões mas contamos obter mais. Se assim for, o senhor não precisará de depor. Mais uma vez muito obrigado. - Eu é que agradeço, senhor inspector. E o homem da PolÃcia Judiciária abandonou a Casa Santos.
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