Antonio
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« em: Novembro 15, 2007, 14:19:57 » |
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Não sou, nem nunca fui, apreciador dos chamados jogos de mesa. Reconheço que podem ser um bom entretenimento e, mais do que isso, um bom exercício mental. Penso mesmo que o xadrez é o único jogo em que o factor sorte não existe. É puramente intelectual ou cerebral ou mental ou racional ou o que lhe quiserem chamar. Em miúdo ainda joguei alguma coisa, com uns tios, nomeadamente a sueca e outros cujo nome não me recordo. E, curiosamente, com cartas tendo os desenhos usados em Espanha. Bem mais sugestivos, por sinal. Como adolescente joguei póquer ao tostão. Mas foi sol de pouca dura. Na tropa, em Angola, aprendi a mexer as pedras no xadrez. E foi tudo. De facto, não gosto! Não me perguntem porquê, pois não sei. Deve ser genético. O meu pai também nunca jogava. Fazendo uma inflexão no discurso, lembro-me de ter lido um conhecido livro de Dostoievsky, “O jogador”, que abordava os problemas psicológicos e comportamentais de um viciado no jogo. Mas pouco mais recordo. Acho que, se tiver oportunidade, ainda o lerei de novo, um dia. Vem isto a propósito de um antigo colega do liceu, o Zé das Iscas, tipo inteligente e de apurado sentido de humor, alto e sempre com um sorriso no rosto que, desde novo, se habituou a jogar póquer com um grupo de amigos. Faziam-no à noite, em casa de um ou de outro. Eram casas independentes, grandes, o que permitia que eles estivessem razoavelmente acobertados dos olhares mais ou menos vigilantes dos pais ou donos das habitações. E o hábito foi-se tornando vício para alguns. O Zé, ganhador habitual, foi dos que se deixou apanhar. Mais tarde vim a saber que casara e tivera duas filhas. Não chegou a tirar nenhum curso superior mas tinha um bom emprego. E estava lançado para criar uma empresa própria. Cheguei a encontrá-lo uma vez, curiosamente no funeral do pai de um amigo comum, teríamos trinta e poucos anos. Estava como sempre: sorridente e mordaz. Passados dois ou três meses, encontrei um velho colega, que me atirou: - Sabes quem morreu? - Sei lá! – respondi. - Foi o Zé! O Zé das Iscas! – anunciou o meu amigo. - Não me digas! O Zé das Iscas morreu? Como foi isso? – retorqui, naturalmente espantado. - Suicidou-se! - Oh pá! Até estou zonzo! – fiz uma pausa e continuei – Estive com ele há pouco tempo e estava porreiro. Mas o que é que aconteceu? - Oh pá! Segundo dizem foi por causa de dívidas de jogo. Deu um tiro na cabeça – concluiu o portador da má nova. E fora, de facto. Pela minha parte só posso dizer, descansa em paz, Zé! Provavelmente alguns de vós conhecereis algum outro Zé que tenha sido vítima do vício do jogo. Mas há muitos outros, viciados, que não chegam a esse extremo, mas tem de viver de forma bem complicada. Na corda bamba, diria eu.
Acho que é caso para mudar o nome à peça: De Maldita cocaína! para Maldito póquer!.
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