No dia 6 de Junho, a presença de todos aqueles
que puderam estar presentes na biblioteca de Leiria
emocionou-me, muito!
Jamais esquecerei esse dia, pelos amigos, pela presença
de muitas pessoas que só naquele dia tive o grato prazer de conhecer.
Goreti, obrigada pelo teu belo prefácio. Pela maravilhosa apresentação
e sobretudo pelo carinho que tens dedicado a todos quantos escrevem
neste site.
A todos, sem excepção, o meu eterno obrigada!
Vóny Ferreira
Aqui fica o prefácio de Goreti Dias.
PREFÃCIO
Podem as gaivotas perpetuar o meu sono,
Explodir o mar em orgasmos de espuma…
(Ficar sem ti, Dilúvios de paixão)
Não pretendendo sufocar as vozes dos textos poéticos,
deixa-se o convite para uma visita à “Nascente dos afectosâ€,
um passeio pelas “Cascata de SÃlabas" e um mergulho nos
“Dilúvios da paixãoâ€.
Numa poesia da vida em singela, mas bela e trabalhada
abordagem, o sujeito poético observa o correr do tempo de
forma incomum, enxergando em cada passo pelo mundo o
extraordinário, apresentado num discurso de 1.ª pessoa onde
o eu é o emissor desta enunciação discursiva em constante
comunicação com um tu – o receptor. A subjectividade está
implicitamente embrincada neste emissor empenhado em
apresentar as cores psicológicas “cores indefinidas do arcoÃrisâ€
através de quadros em que transforma, com a sua
perspicácia de poeta, visões e sentimentos comuns em
preciosidades.
Nos seus textos, a linguagem poética e criadora pode
veicular a ilusão de que escreve para si mesma como forma
de amenizar alguma da sua dor, contar o que a sua alma vive,
ou os seus anseios. A intensidade com que afirma: “Quero,
quero colher glicÃnias nos muros altos, as rosas secas do Out8
ono. Trazê-las num molho colorido, silvestre, que te mostrem
os resÃduos do vento†traça a morada da poetisa no seu poema.
“ Sou um Poema/Não tenho rosto… Não tenho mãos/
Não tenho boca†; “Ando à procura de mim em tudo o que
escrevoâ€, “A gramática arde-me no peito como ferida abertaâ€.
Sem querer atribuir-se à escritora uma intenção de criar
em nós o mesmo desejo, ela acaba por o atingir. De alguma
forma, quem lê procura sempre encontrar nas escritas dos
outros a expressão para os seus sentimentos. A autora consegue
fazer nascer nos seus leitores um tempo-espaço e um
sentir-o-mesmo em sintonia com o seu sujeito poético. Se lhe
lemos uma vontade forte e decidida “ de renascer… para te
amarâ€, patenteia-se aos nossos olhos o inevitável nascer ou
renascer do nosso anseio tornado igual.
“No irrealismo dos sonhos†e na “ linha transversal a
delinear os meus sonhos†a poetisa torna-se mensageira das
dissonâncias da alma, da vontade de olhar para além das palavras
e do limite do eu. A consciência do eu poético permite-
lhe afirmar: “ Um dia hei-de ser capaz de me agarrar à s
asas de uma águia e voar com elaâ€.
Rebela-se contra a sociedade, o amargo desajustamento
de alguns face à vida nela para afirmar numa sistematização
artÃstica: “Os afectos deturpam-se… interrompem-se Ã
mÃnima contrariedadeâ€â€¦â€recebem dos outros ignorância e
desprezoâ€. Diplomática mas firmemente questiona-se/nos:
“Tu e eu temos essa consciência?†“O que fazemos para mudar
o rumo das coisas? As armas, os donos da guerra, a maldita
droga, as crianças violadas, maltratadas. Os rios poluÃdos,
a destruição da Amazónia!â€
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Porque quer “enlouquecer nas nuvensâ€, oferece-nos
através da sua arte um objecto estético do qual usufruÃmos
como leitores hedónicos.
O talento, consciência e dedicação da autora cria uma
lÃrica onde se confundem o dado e o criado enquanto arte. O
magnetismo que se desprende das cadências poemáticas dos
“dilúvios de paixão†é desmesuradamente tenso e inusitado:
“desnudo-me/vestindo-me de ti†e “ só me resta transportar-
-te nos meus dedos e definir-te em acordes de violino a romper
o silêncioâ€. Cruelmente, questiona: “ O que fazes dentro
de mim se eu me desejo fora de ti?â€
A ternura, a decisão enformada na ostentação dos poemas
desta última parte do livro “A reminescência das
palavrasâ€são gritos persistentes em prol do construto mimético
do amor orquestrado numa arte poética de hermeticidade
metafórica e imagética suave, mas meticulosamente entusiástica:
“Eu sou uma estrela/que vai explodirâ€; “Dentro de ti /
Nunca anoiteço!â€
O sentimento amoroso, ideal ou concrescÃvel reflectese
nas metáforas e comparações que se esforçam por traduzir
a intensidade das impressões sensórias: “estar contigo é abrir
o mundo / é fechar no peito a eterna magiaâ€.
O erotismo discreto e terno ocupa um lugar muito importante
na temática de Vóny Ferreira: “ “Vou sonhar contigo…
/ até que a lua nos dispa definitivamenteâ€; “desarrumava
as estrelas do céu… / em eclipses vulcânicas de ausênciasâ€;
“Renascia nas marés intraduzÃveis do teu corpoâ€.
A sensualidade e o misticismo de uma paixão
aparentemente terrena patenteia-se num fascÃnio afirmativo,
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mas determinantemente idealizado: “Só por ti afugento o inferno
/ para bracejar nadando nos rios da luaâ€.
Com a intemporalidade de um texto desnudando a interioridade
do Eu poético “ Ficar sem ti†é o grito supremo
do universo semântico dos textos de “Cascata de SÃlabas"
palavrasâ€: “ Podem as gaivotas perpetuar o meu sono, / Explodir
o mar em orgasmos de espuma†; “Sem ti…/ Despeço-
-me de tiâ€
Com ânsia, amargura ou deleite nos espraiamos no poder
expressivo e exuberante da poesia de Vóny Ferreira. Nela
ouvimos a voz que vem de dentro da sua lÃrica guiando-nos
ao um-outro que se constrói incerto de significações em cada
um dos seus textos e onde acabamos sendo nós mesmos.
Goreti Dias