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Autor Tópico: Litos, o traficante (1ª parte)  (Lida 3288 vezes)
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britoribeiro
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« em: Dezembro 17, 2007, 10:41:56 »

Voltou a olhar para ambos os lados, não viu nada de alarmante na penumbra da rua, entregou a prata ao tipo que estava plantado na sua frente. Dele já tinha recebido os vinte euros que faziam companhia às outras notas no bolso interior do blusão. Fez sinal com a mão, e do escuro aproximou-se outro tipo que, sem qualquer conversa, lhe estendeu a nota azulada, recebendo em troca outra pequena prata.
O Litos era traficante, apenas um pequeno vendedor que mudava frequentemente de sítio de forma a passar o mais despercebido possível pela polícia. Agora estava a fazer a noite perto do Bairro do Cerco.
Lá dentro, nas ruas do bairro, o negócio fazia-se à descarada, tanto na rua como em certas casas. Havia dias que faziam bicha nas escadas dos prédios onde estavam localizados os apartamentos dos traficantes. O problema eram as rusgas que a polícia fazia de vez em quando e lá iam meia dúzia dentro.
Mesmo que acabassem por sair, já ficavam marcados e para não serem perseguidos a cada momento, acabavam por ir dando uns bitaites à bófia. O Litos evitava ao máximo as confusões, tinha começado no “mundo” a gamar auto-rádios e umas carteiras, a “passar” erva ou qualquer coisa que desse um guito para a bucha.
Por causa de um descuido esteve preso em Custoias durante nove meses, foi lá que aprendeu a arte da dissimulação e os passos certos para o negócio da coca e do cavalo. Nunca fora consumidor e ainda sentia um certo nojo só de se lembrar que uma vez tinha fumado uma pedra de haxixe e passara a noite a vomitar.
Aos poucos estabeleceu um grupo mais ou menos fixo de clientes, que ele avisava cada vez que mudava de poiso.

- Põe-te a milhas, estás a olhar para mim porquê? Andor!!!
O magricelas alto e completamente ganzado, cambaleante, virou-se lentamente, tomou balanço e afastou-se aos tropeções.
- Este não dura muito – resmunga entre dentes.
Um carro avança lentamente do fundo da rua. Ouve um assobio, era o Chico a avisar. Recua para o interior de uma porta e fica no escuro à espreita. O veículo passa, pode ser um dos carros civis da bófia, estão sempre a mudá-los.
Antigamente conhecia-os todos, mas agora é mais difícil, até lhe tinham dito que os trocavam com os carros de Lisboa.
Farto de bater com os pés no chão para aquecer e como já há mais de meia hora não aparecia ninguém para comprar, decidiu ir embora. Fez um sinal para o sítio onde devia estar o Chico escondido, que apareceu de imediato e juntos caminharam para o seu velho Citroen AX que estava estacionado numa rua ali próxima.
- Que tal? – Pergunta o Chico.
- Fraco… Fiquei com metade por vender.
- Os gajos ainda ontem encheram a ramona no bairro, é por isso que a malta se está a cortar.
- Humm… Não tem é guito. Ainda hoje o Broas que tem sempre algum, estava liso e deixou-me ficar um relógio.
- É pá, então estás a aceitar essas merdas? Já ninguém dá nada por relógios.
- Este é bom, um Seiko. Cinquenta vale sempre, pelos menos.
Deixou o Chico junto à Câmara de Matosinhos e seguiu para a sua casa que não ficava longe. Estacionou o Citroen a dois quarteirões do prédio onde vivia, meteu a saca plástica com algumas pratas debaixo do tapete do lado do pendura, fechou-o cuidadosamente e esquadrinhou a rua deserta àquela hora da madrugada.
Tinha sempre o cuidado de deixar o carro longe e não entrava em casa até ter a certeza que ninguém o estava a observar.

Subiu no elevador até ao quarto piso, percorreu o corredor suavemente iluminado, abriu a porta do seu apartamento e suspirou de alívio.
O salão à sua frente era grande, o piso em madeira impecavelmente envernizado, cortinados verdes protegiam as vidraças da enorme janela virada para sul. Tirou o blusão, escolheu uma garrafa de whisky no bar, juntou alguns cubos de gelo, preparou a bebida e recostou-se no enorme sofá de couro negro.
Esvaziou o bolso do blusão e dedicou toda a atenção à tarefa de endireitar e ordenar aquele monte de notas amarrotadas. Mais algumas semanas e deixava a rua, era a sua primeira meta, pôr alguém a fazer o trabalho de venda. Era mais seguro, ele só tinha de controlar.

No dia seguinte acordou tarde como habitualmente e quando saiu de casa foi para ir ao Gaveto, uma marisqueira onde era cliente assíduo. Depois de um caril de gambas e uma generosa dose de pudim francês, foi buscar o velho AX e conduziu até à sua oficina, numa transversal da Constituição.
O salão era grande mas estava atravancado de moveis antigos, que ele ia recuperando lentamente e que servia de camuflagem para o seu verdadeiro negócio. Era também aí que guardava a droga, que fazia as pesagens ou o corte, e como trabalhava de porta fechada ninguém o ia lá incomodar. Apenas um ou outro proprietário dos móveis a restaurar é que lhe telefonavam a saber se já estava a obra pronta.

Tinha aprendido o ofício com o Rafael, um marceneiro resmungão do Marco, sua terra natal, que ele aturara durante dois ou três anos, desde que saíra da escola, até que se chateou e veio para o Porto em resposta a um anuncio, onde pediam um aprendiz de polidor.
Conseguiu o emprego, conheceu amigos e não tardou muito a ajudá-los a aliviar alguns carros dos respectivos auto rádios, para depois venderem. Como faltava ao trabalho e muitas vezes ia para lá dormir, o patrão acabou por mandá-lo embora e ele decidiu que já chegava de trabalhar para os outros, ter de os aturar, para no fim do mês receber uma côdea.
Passou a ajudar o Tesouras, um carteirista à moda antiga, daqueles que metia as mãos nos bolsos dos lorpas e eles ainda se riam. Nada de esticões nem de facas a ameaçar, só técnica. Trabalhavam nos autocarros e na linha da Póvoa, mas tiveram de desistir dos comboios porque já estavam a ser topados pelos revisores, que avisavam os passageiros.
Um dia o Tesouras ainda levou uns tabefes, o que lhe valeu foi chegar um polícia que estava de folga e que o tirou daquela enrascada, pois já havia uns gajos que o queriam mandar abaixo do comboio.
Foi quando começou a vender erva à porta de discotecas, porque o Tesouras agora estava mais cauteloso e o que ganhavam não dava para nada.
Uma noite, quando ia passar para a mão de um cliente uma pedra de haxixe, sentiu fechar-se no pulso uma argola de metal frio, era um polícia disfarçado de cliente e ele tinha sido apanhado em flagrante.

Em Custoias ofereceu-se para trabalhar na carpintaria, onde ninguém o chateava e as horas passavam mais depressa. Depressa ganhou a confiança do encarregado da oficina e dos guardas, passando a ter uma liberdade invejável, até porque não havia risco de fuga por a pena ser muito curta.
Ainda ganhou uns cobres a servir de correio entre os poderosos e mandantes da cadeia e, acima de tudo, ganhou confiança com eles, ganhou contactos e informações que esperava serem de utilidade quando pusesse os pés na rua.
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Antonio
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« Responder #1 em: Dezembro 17, 2007, 22:06:50 »

E assim vais criando o teu espólio de histórias de ficção.
Qualquer dia ainda vais publicar um livro de contos.
Mas aguardemos a continuação da história...

Abraço
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britoribeiro
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« Responder #2 em: Dezembro 17, 2007, 22:20:22 »

Ora, sou um mero aprendiz, tenho muito caminho a percorrer.
Obrigado pelo simpático comentário.

Abraço
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Antonio
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« Responder #3 em: Dezembro 17, 2007, 22:29:22 »

Eu comecei a escrever em Fevereiro de 2005 e já tenho material para 3, 4 ou mais livros.

Abraço
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Goreti Dias
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« Responder #4 em: Dezembro 17, 2007, 23:20:35 »

Olha que às vezes apetecia-me cometer um crime que me deixasse descansar em Custóias... Cá fora só se aproveita mesmo o pudim francês... até as gambas se dispensam... Um belíssimo conto!
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britoribeiro
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« Responder #5 em: Dezembro 22, 2007, 19:37:42 »

Acho que não se aproveita nada de Costóias. Mesmo sendo uma "selva" mais vale descansar cá fora.

Abraço
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britoribeiro
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« Responder #6 em: Dezembro 22, 2007, 23:14:00 »

Desculpem, Custóias!
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Bom dia. Para todos um FigasAbraço
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Sejam bem vindos às escritas!
Agosto 14, 2023, 16:52:48
Boa tarde!
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Bom Ano! Obrigada pela companhia!
Dezembro 30, 2022, 19:42:00
Entrei para desejar um novo ano carregado de inflação de coisas boas para todos
Novembro 10, 2022, 20:31:07
Partilhar é bom! Partilhem leituras, comentários e amizades. Faz bem à alma.
Novembro 10, 2022, 20:30:23
E, se não for pedir muito, deixem um incentivo aos autores!
Novembro 10, 2022, 20:29:22
Boas leituras!
Novembro 10, 2022, 20:29:08
Boa noite!
Setembro 05, 2022, 13:39:27
Brevemente, novidades por aqui!
Setembro 05, 2022, 13:38:48
Boa tarde
Outubro 14, 2021, 00:43:39
Obrigado, Administração, por avisar!
Setembro 14, 2021, 10:50:24
Bom dia. O site vai migrar para outra plataforma no dia 23 deste mês de setembro. Aconselha-se as pessoas a fazerem cópias de algum material que não tenham guardado em meios pessoais. Não está previsto perder-se nada, mas poderá acontecer. Obrigada.

Maio 10, 2021, 20:44:46
Boa noite feliz para todos
Maio 07, 2021, 15:30:47
Olá! Boas leituras e boas escritas!
Abril 12, 2021, 19:05:45
Boa noite a todos.
Abril 04, 2021, 17:43:19
Bom domingo para todos.
Março 29, 2021, 18:06:30
Boa semana para todos.
Março 27, 2021, 16:58:55
Boa tarde a todos.
Março 25, 2021, 20:24:17
Boia noite para todos.
Março 22, 2021, 20:50:10
Boa noite feliz para todos.
Março 17, 2021, 15:04:15
Boa tarde a todos.
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Olá para todos!
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Olá para todos!
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Bom fim de semana para todos
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Boa quinta para todos.
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Boa noite para todos.
Março 02, 2021, 20:10:50
Boa noite feliz para todos.
Fevereiro 28, 2021, 17:12:44
Bom domingo para todos.
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