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Autor Tópico: EXPLICA-ME O DEUS MÃE  (Lida 1786 vezes)
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Burity
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« em: Dezembro 23, 2009, 12:40:56 »

 "Fonte nauseabunda de pecúlios sem regra, um esquimó sôfrego de espinha entalada, a rastejar-se sozinho nos gelos imaginados das janelas avulsas da cidade a perder-se, um céu à esquina, um delírio inventado para me contorcer como ele em vómitos corrosivos de agentes da lei deflagram-se sem fim, como quando era pequeno ia devagar ao zoo ver os desenhos animados à volta da minha casa, pendurados nos estribos de arame esticados para me deliciarem, o cheiro arruinado estendia-se pelos enxofres varridos da tarde naquela visita solitária da minha vontade às paredes fechadas. A voz da minha mãe enxotava-me para o interior, recriava sem regras, enfim, passos como outra coisa qualquer na andadura do tempo, na andadura das sementes que secam no quintal das nossas rezas, sim, ela era fiel, é ainda fiel aos pergaminhos divinos da igreja.
Talvez eu soubesse do riso, sentisse sobre o mar os navios enxotados nas ondas, um dia a margem incumbira como recado desligar-me das coisas desta rua onde moro, um lugar distante da terra com efeitos de estrelas, uma viagem dos sonhos na viatura de ninguém na estrada de nada o refutado silencio, de dois que apenas se falam no silencio dos lençóis, despidos, de costas um para o outro, ninguém ali sabe rezar e isso nunca me agradou, pergunto, que aventas do terço?, nada a responder na sala, ninguém segue comigo o silencio secreto ou sagrado desta morte de vícios, queira um dia a mata sufragar-me, deleitar-me nos seus silêncios escondidos por trás da vontade como quem se embala num refego de calmas perdidas, explica-me então tu o que souberes dos passos a caminho das nuvens, fala-me das coragens inventadas das leituras abortadas, desse rosto sem explicação faz-me entender o silencio, explica-me o retorno dos beijos e que mais, como estrada difusa de lados barrados pela alcofa metálica dos rails, como se um raio nos invadisse madrugadas a fim, a fim de descobrir-me por margens caladas. Ao ler deliciosamente este recreio descrito nas páginas da vida vou lentamente entrando numa dispersão vagabunda dos meus vícios, sem medos, como se fosse por ventura um soldado abandonado nos claustros da razão e deglutir-me, ali mesmo, para que se saiba, os recreios elaborados por dissertações de filosofias encarnadas na pele da gente de lá, ou fossem refrães de cânticos natalícios estes beijos que sinto na tua pele? 
Entende como navego sobre o mar escondido dos meus ombros, rasgados na falésia inerte dos meus passos, por este caminho sentirei, penso, o vento nómada das sombras refastelados na sua embriaguez solitária, prevarico com insónias o reflexo abandonado deste mar refugiado nas pálpebras sequiosas da tua voz e nelas, um divino silencio que procura sem destino a verdade escrita nos refugos de livros acoplados na estante, li e reli, embora não saiba mais que aquilo que me despertam os sentidos, embora o amor caloroso do teu corpo me desperte insónias voluptuosas de regalos sobre ti, sim, na cama mórbida das viagens, um soluço, um sussurro de maresias salgadas, sabes como me deixam desparasitado os teus soluços sobre esta cama de amores entre dois corpos nus, na cintura da tua voz a refegar-me devagar, indo eu mais lentamente ao casulo do teu segredo, foi assim sabes?, que quis sempre devorar-te no bom sentido da palavra, desarrumar o esconderijo pélvico da tua casa, cama, armários e vidros, os reflexos contra nós a mostrarem-me como te diriges sem gestos, sem mar, sem vontade, qualquer coisa explicaria a vontade abandonada entretanto porque tu, soube, encerraste as pernas nesta caminhada. Explica-me o Deus mãe. A cruz da parede, na sala dos teus sonos, onde me dirijo pelos passos esfumados, desacreditado talvez caminhe eu nesta rua de bares e noites ao fim de tantos nadas alojados no varandim rude da minha dor silenciosa, e na rua da nossa casa os gritos esfumados que me infrinjam subserviência, a casta e pálida vontade não se apraz valiosa, se fosse como Deus quer eu seria um resto de vento na varanda coberto de pasmos descoloridos na voz acre da vossa impedância, explica-me se souberes o casulo das resmas da rema e que lá consiga dormir um sono de morte, nas esferas mórbidas dos azulejos de cristal das tuas razoes, por isso, explica-me, se souberes mais que o que sei, neste regresso das esferas adormecidas, posso ainda aqui sentar-me?, deixas que me deite de novo na tua cama, a ouvir os cânticos de antigamente?, sabes, como quando era pequeno, sentado nas enguiças verdes dos meus delírios, na pista de mar destes metais oferecidos pela insanidade dos meus amores, tenho vontade outra vez de ser mártir na cama dos fundos, vontade de ser novamente carraça, como o sou na tua pele, sinto uma vontade não explicada de seguir a minha vida nestas ruas onde nem sequer um nada me ouvirá, o jantar sublime das tuas palavras a incutirem-me a solvência que mereço, aquele riso a anilar as minha voz, escuta, se fores capaz, que entidade se submeterá a tanto nada?, sempre pensei coisas diferentes para a vida, como  o céu longe da nossa pele, sempre imaginei o amor das nuvens uma estirpe dos ventos a avassalarem-me nos lençóis, de corrupios, estremelicos, aqui não, não consigo, aqui há remelas verdadeiras a calarem-me sempre. Mesmo nos sonhos. Senti sempre na voz dos doutos este requinte a esvaziar-se, como cogumelos na frigideira sobre ovos escalfados, no fervor árduo dos óleos de cheiro desconhecido, a janela trepidava como a tufa dos vapores, os ricos na rua dançavam o ultimo dia do ano como se fosse de novo começarem os estribilhos afogueados pelas chamas antigas do chiado, mais abaixo, nada se mexia, ninguém ousava uma palavra, como templários das razoes divinas, era da igreja o ultimo cânone definhado e mal vestido, um sabor a nuvem nas mãos, havia um livro requintado numa capa dura de cores que não entendi, talvez encher-me a barriga nos amorfos passados de morte, este corredor cheio de gritos, de gente com as mãos no ar, lá fora, o guizo arranhado de carros de transporte de doentes a enlouquecerem-me qualquer vontade, não, pensava, explica-me o deus mãe, nestas malas encostadas ao varandim, o sossego húmido dos sapatos que ninguém usa mais, hão-de ser um dia de alguém, não vá o fim corroer-me, comece pelos ossos e se espalhe pela casa, quando me deitar na cama das viúvas sem rumo, ou encher a barriga com castrados silêncios a emoldurarem-me as falanges partidas, este estuque nas goelas, brancos destinos, na cama, com gestos de auto sacio, nas costas arranhadas o café seco nas escamas atiradas ao lixo num canto de porcos cuidados, a cozinha e nela o pó dos ventos varridos há que anos não sei, não me acomodo mãe, quero o exílio como estes comunistas de anos atrás na fronteira, uma tentativa falhada sei, não fujam antes que a morte vos pegue, pensava. Saberemos entender quando o amorfo nenhum destas coisas espalhadas na viagem? A porta da viatura abrira-se. Saíra de dentro dela uma figura estanque. Pernas, a luzidia passada disforme como contrários de forma, gestos, seguia uma esfumada distancia apenas muito curta, devoluta? Explicava-me um velho à esquina, as barbas na rua, desciam vagarosamente um silencio antigo, um silencio amargo como quem já sabe de cor os olhos, uma voz a tinir-se desejos já não, vontade de uma garra antiga ele pega o cigarro e explica, enquanto a manda vulva percorre ate desaparecer nos céus definhados, longas, entre os dedos, uma cor escura de sujo, penso, olhava-o sem displicência, parecia-me viver um escuro iluminado havia já tempo de mais calculava entretanto, uma diáspora alojada nestes escombros soterrados, agente lá, umas vielas secretas na barriga, um grito com tons de sal nenhum na sala a ementa nada e nós, quase nenhuns, filhos impróprios do resto que a vida aloja num sacrifício de plástico numa casota de cão a verter verdes vómitos no metal branco que chiava nas palmas, o mecânico arranhava sem dó, ninguém mais como nós, sendo que ninguém mais existe, fechei a porta como se oclusas fossem um ferro forjado na derramada cama, vem fazer o amor. Que me importa! Poderiam nascer a sul do corpo como lágrimas. Escorrerem devagar na longa avenida dos sonhos esta despontada nojice. Há quem, penso, sei que em algum lugar terei um dia ouvido, o nojo inventado também se coloca nos lençóis, nunca os mudes, melhor que viver uma pausa nos limos antigos daquilo que alguma vez terá sido? A mesa está posta e nela, o suor sôfrego de quem quer, um dia talvez, beber colossos golos da tua alma depositada nesta coisa que tocas, como os teus dedos longos, castanhos, uma refeição que nos empolgará quem sabe a coisas esgrimidas uma vez que seja, talvez saibas, não sei o teu nome nem quero, ao menos te deitasses comigo e me desse cocos na face até explodir-me num espasmo raro para dentro de ti, sem o saber nórdico dos frios, não vou nem quero assim deglutir-te, quero sinceramente mais da tua voz arrastada nos vagares calmos de mais uma noite pensada e entretanto a refeição fria, abraça-me. Não ligues ao meu nome.
A caminho de colares, num silencio ensurdecedor, lado a lado nesta viatura que me atura a sei lá quantos anos, de ferros a estalarem a cada curva, na frente, o brilho profundo das lâmpadas de néon, modernas, como se um farol me guiasse, passa a tua mão por mim, dizia, escurecido num nervo de cataclismos, nada saía entretanto, proscrito, esta voz análoga nas esfinges frias do curso da via para que me entrego, como que nada de mim fosse possível, os ferros da cama soltos na memoria, enferrujados de vómitos a esquecer por diante, se uma dadiva divina na berma, uma oração pelas etapas, ensina-me mãe, como esquecer o dilúvio que me leva por instantes sem que me saiba pertencê-lo, penso, ao fundo, o degelo amargo destas noites infindáveis comigo neste arroto de vésperas, penso, serei eu ali?, deito-me de cócoras numa abstinência de vultos disfarçados, a encorajar-me como o apetite rarefeito desta refeição ambulante, cheia a mesa de funestos silêncios espalhados pelas orlas e pelos cantos, dobrada a toalha num esplendor de cores, o grito surdido na vastidão inócua da sala, os armários difusos espetam-se no alçapão e pelas paredes o branco profícuo da cor sem sentido nenhum, detesto paredes brancas, sempre a sensação que fica é a de que nada mais há para além, não me configuro nas suas sombras, nem divindades, pelo aspecto que por ventura teriam,  e a estrada ruge-me declínios sobrantes no desfalecer do caminho, a deixar para trás o evento de máscara das árvores, um resto alucinante, onde me expliquem, precisaria, garanto, numa sala escondida no armário dos bolsos se assim tiver de ser, os cheiros nascentes pelas gavetas às marretadas tentando abri-las, sem a chave não terei solução, e enfim um mar nas exóticas sapiências da minha breve noitada a desfalecer pelo alvorecer dicotómico e excêntrico declínio, bem ali, na cratera das nuvens curvadas para a estrada, como se tudo fosse naquele instante o cheiro dos corpos, como um valor em descrédito, vontade de sentir as tuas unhas nos lábios, na estrada para colares chegaríamos ao fim de tanto tempo, cinquenta minutos de viagem nesta lata com rodas a degolar-se pela estrada, os bancos escurecidos não fosse o éden interior ou das janelas ávidas a sorverem do céu a lua nova, manhã, um porteiro de fato da cor dos mortos, acena-me desaparecido num gesto e sem placas, sigo-o, vendo-o na confusa concentração com as mãos a misturarem-se no vento, erguer que cancela?"   
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Goreti Dias
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« Responder #1 em: Dezembro 23, 2009, 20:12:18 »

Uma prosa densa, de alma e carácter!
Beijo
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Goretidias

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Bom dia. Para todos um FigasAbraço
Agosto 14, 2023, 16:53:06
Sejam bem vindos às escritas!
Agosto 14, 2023, 16:52:48
Boa tarde!
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Bom Ano! Obrigada pela companhia!
Dezembro 30, 2022, 19:42:00
Entrei para desejar um novo ano carregado de inflação de coisas boas para todos
Novembro 10, 2022, 20:31:07
Partilhar é bom! Partilhem leituras, comentários e amizades. Faz bem à alma.
Novembro 10, 2022, 20:30:23
E, se não for pedir muito, deixem um incentivo aos autores!
Novembro 10, 2022, 20:29:22
Boas leituras!
Novembro 10, 2022, 20:29:08
Boa noite!
Setembro 05, 2022, 13:39:27
Brevemente, novidades por aqui!
Setembro 05, 2022, 13:38:48
Boa tarde
Outubro 14, 2021, 00:43:39
Obrigado, Administração, por avisar!
Setembro 14, 2021, 10:50:24
Bom dia. O site vai migrar para outra plataforma no dia 23 deste mês de setembro. Aconselha-se as pessoas a fazerem cópias de algum material que não tenham guardado em meios pessoais. Não está previsto perder-se nada, mas poderá acontecer. Obrigada.

Maio 10, 2021, 20:44:46
Boa noite feliz para todos
Maio 07, 2021, 15:30:47
Olá! Boas leituras e boas escritas!
Abril 12, 2021, 19:05:45
Boa noite a todos.
Abril 04, 2021, 17:43:19
Bom domingo para todos.
Março 29, 2021, 18:06:30
Boa semana para todos.
Março 27, 2021, 16:58:55
Boa tarde a todos.
Março 25, 2021, 20:24:17
Boia noite para todos.
Março 22, 2021, 20:50:10
Boa noite feliz para todos.
Março 17, 2021, 15:04:15
Boa tarde a todos.
Março 16, 2021, 12:35:25
Olá para todos!
Março 13, 2021, 17:52:36
Olá para todos!
Março 10, 2021, 20:33:13
Boa feliz noite para todos.
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Bom fim de semana para todos
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Boa quinta para todos.
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Boa noite para todos.
Março 02, 2021, 20:10:50
Boa noite feliz para todos.
Fevereiro 28, 2021, 17:12:44
Bom domingo para todos.
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