Conto Maldito- Parte III

Saiu do seu apartamento por volta das dez horas da noite com o seu casaco de malha comprido e de com o capuz sobre a cabeça. Ela era assim, as suas cores preferidas eram o negro e o negro e o vermelho, tal como o seu apartamento, tudo pintava de modo inequívoco o quanto de dor lhe passava na alma e no pensamento.
Num passo ansioso atravessou a avenida em direcção à praia, com o coração mais ruidoso que um escape entupido e uma respiração que denotava que havia corrido durante horas a fio. Havia escurecido já algum tempo, o mar estava calmo, todo o cenário da noite anterior se reproduzia de novo na sua mente afigurando-se agora muito mais próximo da alucinação do que da verdade... Chegara ao local onde ele a havia encontrado, lançou um olhar esperançoso mas logo o mundo caiu aos seus pés, Sim foi alucinação, Ele não está aqui, Ele não existe... Enquanto mergulhava no pessimismo destes pensamentos, deu um grito estridente, quando de repente uma mão forte entrelaçou na sua... Não posso acreditar é mesmo real, Ele existe mesmo, Sim ele chegara, ele estava ali... Ambos foram impelidos pelo mesmo impulso, ambos foram levados até aquele local em busca da Verdade ou da Alucinação percorrendo o caminho do olhar penetrante que haviam trocado e até então os perseguia...

Ele agora sorria assustado devido modo como Ela reagira... As maçãs do seu rosto coravam profundamente, Ai, como o pulsar de seu coração batia ao mesmo ritmo que o seu, como.... Como se haviam descoberto em apenas dois dias...Como se haviam apaixonado.... O olhar e as poucas palavras já trocadas foram o bastante para demonstrar o quanto ainda tinham a dizer um ao outro sob aquela lua e ao som daquele mar...

Manuel agarrou-lhe a mão, Vou levar-te a um sítio que magicamente te dará um pouco mais de cor ao teu espirito e te permitirá sorrir um pouco mais, mostrando quem já foste e quem não és agora...

Caminharam de mãos dadas ao longo da praia numa bela sincronia de passos pensando ambos como tinham ido ali parar...

Seguiram depois por um quarteirão, viraram numa esquina e estavam de fronte de uma enorme mansão que mais se assemelhava a um palácio, com grandes janelas, traços simples e imponentes, parecia quase saido de um conto de fadas... Entraram por um portão enorme, seguido de um pequeno caminho feito de pedra que os conduziu a um belo e impressionante jardim, que à luz da lua e das estrelas, parecia realmente a coisa mais sufocantemente encantadora do mundo... O local onde estavam agora era rodeado de grandiosos chorões cujos ramos pendiam como lágrimas em direcção ao solo, onde Deuses recitavam poesias incandescentes e promissoras desprovidas de amarguras e lamúrias, carregadas de paz, unicamente e exclusivamente paz... Com a brisa vinha o cheiro de rosas, e o som de uma fonte onde jorrava água de um jarro de uma sereia como quem limpa a alma...
Em todo este ambiente de Brisa, Cheiro, Luz, Som e Movimento se deitaram ambos sobre a relva contemplando as estrelas deixando que os seus espíritos se enchessem por aquela paz tão reconfortante. Não trocaram palavras, não se moveram, Nada, somente ficaram ali juntos observando as estrelas e a Lua que lhes sorria.....

Quando finalmente se levantaram, fitaram-se ternamente e no rosto dela somente corria uma enorme torrente de lágrimas sinceras daquelas que nos lava a alma, ele limpou-lhe as lágrimas, beijou-lhe novamente a face e levou-a a casa no seu Porsche...

-Obrigado, foi uma noite realmente mágica, sinto-me leve capaz de voar por aí como uma pluma....

- O amor que nos encontra não é aquele que nos cega mas aquele que nos mostra a verdade, aquele que nos faz ver quem somos quando estamos com a pessoa certa...

Repousando uma hora mais tarde no seu sofá junto a um quadro de família, estas palavras ainda ressoavam na sua cabeça como que descortinando o seu sentido no sabor do encontro dos seus lábios quando se despediram naquela noite...

Tudo estava perfeito ser arrancada do seu sonho pelo telemóvel....

Algo de grave havia acontecido.....