A ALBINA E O PRÍNCIPE 1

[Vitor da rocha]

PARTE 1

Em socos vai para o monte, Leopoldina, pela terra dura, vai segura e não formosa, leva atrás duas cordeiras, do melhor que ela sabe ordenhar, cada uma com sua campainha que ao longe se ouvem tocar, nos cabelos de trigo maduro um lenço de azeviche, e nos peitos blusa de fantasia berrante, mais própria de moça cantante que de simples pastora errante, uma saia de chita coberta de quadrados de mesa de restaurante, um bolso em cada anca como se guardanapos de clientes fossem, meias de lã castanha que ela não soube tricotar, esticadas até meio da canela, que para mais a lã não esticou, bem contada pela tabela, pela boca da mãe dela, meias rotas nos calcanhares dos anos no seu calçar, não vai formosa mas vai segura, de cabecinha e compostura como as da freira mais pura, mente de cinco Primaveras em corpo de vinte Outonos, onde não cabem temores nem dores, imaculada como neve acabada de cair antes da primeira pegada se sentir, nem homens nem almas perdidas se atrevem a perdê-la, paralisados pela crença de tanta inocência, os lobos dela e de suas cordeiras se temem, pela auréola que as envolve e onde pressentem o dedo de Deus Pai a guardar as suas filhas dilectas em meio de gado sem conta, formosa ela não é, de olhos de menina de Taipé, duas amêndoas de Páscoa no lago côncavo das órbitas, pele rosada de senhora fina mais que de albina bastarda, ratinho branco em ninhada escura, ganso alvo em meio de patinhos floridos de amarelo, palmo e meio de diferença perante muitos palmos de semelhança, gato preto em campo de neve, noviça entre monjas maduras, perna manca entre quilos de músculos firmes e ossos direitos, esquerdina no mundo dextro, ano bissexto para três comuns, trevo de quatro folhas no mar de irmãos tercetos, judia na Alemanha do Adolfo e alemã entre o povo eleito, maçã podre a eito em cabaz de fruta normalizada, corpo roliço em passerelle de carnes magriças, sim, formosa ela não é, ateu em montanha de fé.