gina
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partilhar palavras antes que o vento as leve
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« em: Abril 20, 2008, 11:52:24 » |
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Finalmente vê-se, sente-se, ouve-se e cheira-se a Primavera. O céu pintado de azul-bebé com algumas nuvens quase transparentes e dispersas, filtram o Sol aquecendo a alma suavemente, e tornando a pele rosada depois de tanto tempo pálida, coberta por camadas de roupa durante um Inverno, frio, chuvoso, cinzento sombrio triste, quase zangado.
Os passarinhos falam, comunicam entre si tranquila, e alegremente como se sozinhos estivessem, não se importando com as pessoas que pouco a pouco se vão sentando ao Sol, timidamente despindo as camadas invernosas de roupa que de manhã cedo pareciam ser necessárias mas que agora já apetece preguiçosamente retirar para permitir que a pele respire livremente e assim deixar a brisa leve e morna passar pelo nosso corpo, dando-nos a sensação, que por magia o mau tempo já lá vai e a esperança de uma nova vida não só vem com a Páscoa pela parte religiosa, mas também com a Primavera pela parte cÃclica da vida e das estações do ano, com toda a natureza a renascer, incluindo nós.
Em frente, como pano de fundo deste cenário abrangente e belo, tenho o Tejo, tranquilo privilégio dos lisboetas, hoje pintado de azul quase turquesa; à esquerda o Padrão dos Descobrimentos, imponente sÃmbolo de outros tempos, outras paragens, mas também de valentia, audácia, curiosidade, história dos portugueses. Mais além, a Ponte 25 de Abril, sÃmbolo de modernidade não muito recente, ao mesmo tempo que representando a comodidade, também o trânsito caótico e nervos à flor da pele.
Retiro a minha vista do que me lembra o caos, e elegendo a calma pachorrenta, miro ao longe um barco enorme, que passa deixando um rasto prateado atrás de si, estendendo-se até se perder de vista.
O Cristo Rei continua a abraçar Lisboa, a amá-la acarinhá-la, protegendo-a.
Onde estou eu? No Jardim das Oliveiras, local privilegiado pela vista, no Centro Cultural de Belém.
As oliveiras, têm o privilégio, de sentir pousar nos seus ramos os passarinhos que como eu, sentem-se felizes por este dia primaveril que nos enche a alma. As pessoas, essas vão aparecendo, sentando-se ao Sol, como caracóis sentindo os primeiros raios mornos e apetecÃveis.
O que estou eu aqui a fazer neste estado de paz, nesta pacata beleza, dispondo só para mim estas três horas roubadas à minha rotina diária?
Estou finalmente de “pena em punho†começando a soletrar as primeiras letras daquilo que há muito percorria a minha memória em momentos de vazio, silêncio ou lazer; por vezes até na escuridão da noite onde as ideias fluem mais facilmente e se multiplicam em catadupa.
Quero soltar a mão, a pena e o coração, deixando as recordações emergirem, registando-as para satisfazer este meu desejo, quão desabafo com o papel, ou quiçá satisfazer curiosidades.
O meu pensamento vagueia, desta vez mirando um barco enorme que passa no Tejo, e lembra-me do privilégio de estar aqui em vez de fechada em casa. Num fechar e abrir de olhos vejo desta vez um veleiro e sigo-o com os meus olhos, imaginando-me lá dentro, vendo apenas o intenso azul do céu e o leve bater das ondas, à medida que este se desliza preguiçosamente.
Olho o papel, paro de sonhar…onde vou eu? Não resisto, enquanto penso vou admirando a cor quase turquesa da água, mas agora com um banho prateado reluzente.
Ao fundo os montes verdes da outra banda, viçosos pelas recentes chuvas, são belos, mas o rio fascina-me mais parece levar-me numa viagem, e a minha mente vai divagando, ouvindo ao longe duas crianças brincando ao Sol, com os seus chapelinhos na cabeça como se Verão já fosse.
Penso que talvez a minha vontade de escrever, consta de uma certa necessidade que há algum tempo tenho sentido como que para preencher um vazio.
Diz-se que a vida é o que fazemos dela e que podemos mudá-la se quisermos, será que existe alguma verdade nesta frase? Se assim for, então não tenho feito um bom trabalho porque a minha vida tem-se desviado várias vezes do caminho que eu desejaria percorrer. Meto-me por atalhos, em ziguezague, e não consigo chegar onde quero. A vontade de querer mudar o rumo existe, e a vontade de ser feliz é mais que muita, será que consigo a força necessária para o fazer?
Posso chegar à conclusão que escrevo para mim em tom de desabafo, e olho em frente imaginando-me naquele Tejo, naquele veleiro fugindo de tudo o que me apoquenta, e atracando em terra quente, afável e tranquila.
Talvez um dia largue as amarras!
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