Antonio
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« em: Abril 29, 2008, 12:55:58 » |
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A noite foi de insónia para muita gente: para o Tiago que só tarde e no escuro logrou sucumbir ao sono e à fadiga fÃsica e psicológica; para a mãe que cedo foi para a cama mas não conseguia pregar olho e de vez em quando se levantava para ir ver se o marido estava bem na sala onde, ora sentado ora deambulando, pensava na forma de ter o dinheiro todo preparado o mais depressa possÃvel; ele mesmo se deitou tarde e teve de tomar uns comprimidos para dormir como o fizera cerca de uma hora antes a sua Zulmira; para o Morais que congeminava sobre a maneira de pôr em prática o que lera nos livros de Arthur Conan Doyle, Agatha Christie, Georges Simenon e outros; para o Eurico que ficara, naturalmente, perturbado; para a Eulália que molhou a travesseira com as lágrimas que verteu pelo seu menino; para os raptores, provavelmente... Na manhã de terça-feira, enquanto o Jaime tratava de reunir o dinheiro para pagar o resgate, a mulher foi à escola para saber se alguém tinha visto o filhote. Ao fim de algum tempo regressou a casa pesarosa pois alguns alunos tinham-no visto virar para a rua nova...e mais não soube. No caminho de regresso encontrou o vizinho Morais acocorado junto da berma do passeio. - Bom dia, senhor Morais! - Bom dia, D. Zulmira! Há alguma notÃcia? - Venho agora da escola e ninguém o viu. E contou-lhe tudo o que sabia, espicaçada pelo candidato a detective. - Pois eu ando aqui a ver se encontro alguma coisa no chão que possa ter caÃdo ao Tiago ou ao raptor. Eu diria antes, raptores, pois uma acção destas requer normalmente dois celerados, pelo menos. - Muito obrigado pela sua colaboração! Agora vou a casa e depois para o escritório. E despediram-se. O António Morais continuou a sua pesquisa mas em vão. Andou mesmo a espreitar para o caminho entre o portão da vivenda do Campelo e a porta de entrada. Pensou: - Se o teimoso do Jaime tivesse um cão ninguém poderia ter colocado a carta sem ser denunciado pelo animal. Mas ele diz que detesta bichos... Quando reentrou em casa, elucubrou: - A maldita chuva limpou possÃveis pegadas que o portador da carta tivesse deixado. Mas acho estranho que tenham vindo fazer esse serviço tão cedo. Podia ter sido o Eurico a trazê-la. Mas é irmão do Jaime, embora não simpatize muito com ele. Enfim! Todos devem ser considerados suspeitos... E sentou-se, mas continuou a matutar: - Ora vejamos! Penso que serão mais do que um, os raptores. E das duas uma: ou é gente conhecida, daqui ou de perto, ou gente de fora eventualmente lesada pelo Jaime e que agora se quer vingar. Se fosse gente de fora provavelmente teriam sido vistos a rondar a casa para estudar locais e movimentações; vou tirar a limpo se alguém viu algo suspeito, mas não me parece que alguém tenha visto movimentos estranhos em dias anteriores. Se for gente de cá...acho que vou seguir a pista do Eurico e ver até onde leva. Pouco depois andava a falar com os vizinhos e ninguém se tinha apercebido do que quer que fosse de invulgar nos dias anteriores. Depois foi a casa do Campelo e falou com a Eulália. Esta também não se dera conta de nada nem ninguém nos dias que precederam o rapto. - Ó D. Eulália! O Sr. Eurico vive só? A mulher estranhou a pergunta mas respondeu: - Vive só! Mas com a idade que tem deve ter alguma amásia. - E não sabe quem é? – inquiriu o antigo bancário. - Eu? Estou sempre aqui metida. Se alguém souber alguma coisa é a gente da agência. - Vou lá! – pensou o homem. Conversaram mais um bocadinho sobre o tempo que, nessa manhã, estava mais simpático, cinzento mas sem chuva, e pouco depois despediram-se. O “detective†foi buscar o seu Mercedes negro e dirigiu-se para o centro da cidade. Passados uns vinte minutos entrou na loja, coisa que ninguém estranhou pois fazia-o pelo menos uma vez por semana. - Bom dia a todos! - Bom dia, senhor Morais! – ouviram-se só duas ou três vozes. Olhou e viu que só faltava o seu amigo Jaime. Apesar do mau feitio deste, o vizinho entendia-se bem com ele pois era um tipo calmo e paciente. - Estou a ver que o Jaime anda a tratar do assunto – disse. - Sim! – respondeu a mulher sem levantar os olhos da secretária. Notava-se que não queriam falar no rapto ou em qualquer tema que lho fizesse recordar. - Vou à casa de banho e venho já! – avisou o António Morais. Uma vez lá dentro escreveu num pequeno papel: “O Eurico anda com alguma mulher?†Guardou-o e reentrou no open space. Dirigiu-se para a secretária do jovem Paulo e sentou-se, ao mesmo tempo que lhe colocava debaixo dos olhos o papel em que acabara de escrever e perguntou: - Então sempre vai passar uma férias de inverno aos montes Cantábricos? - Se tudo correr bem espero fazê-lo. Aproveito os bons preços que a agência me arranja! – respondeu o moço que tinha vinte e dois anos. E embrenhou-se a escrever qualquer coisa. Logo a seguir o papel estava de novo em frente do reformado que leu: “Anda com a Sandra, mas escondido do Sr. Jaime porque este não gosta que os empregados namorem uns com os outros†Aproveitando o silêncio reinante o visitante falou para a Sandra: - Então, Sandrinha! Como está a sua famÃlia? Os seus pais e a sua irmã? - Estão todos bem! Mas eu não tenho irmã. Tenho um irmão: o Bruno. - Ah...como está a minha cabeça! E que faz ele que também não me lembro? - Trabalha numa agência imobiliária – respondeu descontraÃdamente a rapariga. - E já é casado? Ora! Desculpe a minha curiosidade! Não responda para eu aprender a não ser metediço – procurou jogar o Morais. - Não faz mal! Esteja à vontade! Ainda é solteiro mas vive com a namorada. E se quiser saber tem mais dois anos do que eu: vinte e nove - Agora a juventude prefere co-habitar a casar. Se calhar é o que fazem de melhor. Depois voltou-se para a jovem Catarina: - E com a sua famÃlia também está tudo bem? Também vai co-habitar? - Está sim, senhor Morais! – respondeu a linda jovenzinha. E concluiu: - Eu espero casar! Mas ainda só tenho vinte anos. E a conversa acabou porque o Eurico propôs: - Vamos almoçar?
(escrito em 17 de Outubro de 2007)
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