Maria Gabriela de Sá
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« em: Outubro 06, 2023, 15:33:41 » |
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Dia 4 de Outubro de 2023 Marilyn Enquanto espero que me mudem uma lâmpada fundida no carro Penso em ti Marilyn E penso também Em todas as mulheres que amaram Como tu Marilyn E não foram amadas Como tu não o foste Marilyn. Tão bonita, sensual e ingénua Marilyn Não te deste tempo suficiente para saberes De certeza feita Do amor circunscrito à s pulsações do género homem No desejo-dor que a tua beleza lhes exacerbava E na sua satisfação premente, uma morte urgente A tua morte também, Marilyn A morte pelo prazer Escravizante nessas horas E quando a natureza é a única voz que tem poder para se fazer ouvir. Não sabias disto Marilyn? Ou talvez não o soubesses desta maneira Que é abstratamente bonita Poeticamente sublime Concretamente arrebatadora Se Se tudo isso te fosse AMOR E não tu um mero fetiche Um trofeu dos homens Que Em concreto Te possuÃram. Tu, Marylin Tu que eras apenas mulher e querias ser apenas uma mulher amada Que não foste, Marilyn E talvez vás até lembrar ainda, Marylin Nesta bendita luta Onde umas mulheres parecem mais mulheres do que outras Que, no turvo do pensamento, numa roda de amigos Com copos de vinho e gargalhadas à mistura Talvez pelo menos um homem dos que te não amaram Te tenha chamado mesmo puta Enquanto tu eras apenas mulher e procuravas apenas o Amor. Não te lembras disto Marilyn? Fizeste bem, esquecer. Ou talvez tenhas apenas relevado. Agora eu conto-te o resto Marilyn Morreste Jovem e bela, e agora és um Mito, Uma Lenda. Mas eu, Marilyn, gostava de saber mais de ti: Para que te suicidaste, Marilyn? Quantos comprimidos tomaste Para adormeceres ou não voltares a acordar? Foi um por cada homem De tantos que não te amaram como tu querias e merecerias? Por que não aguentastes mais umas horas a insónia E te levantaste à s primeiras horas do dia Quando a vida parece quase sempre mais suportável? Depois da longa noite Limpavas, Marilyn, as lágrimas ao lençol Tomavas um paliativo banho Como fazem as raparigas depois de terem sido violadas Por alguém que não sabe o que é a poesia do Amor E do sexo com Amor. Como se essas raparigas, Marilyn, As raparigas violadas Quisessem tirar de si Todas as imundices do mundo concentradas em quem as violou. Punhas depois uns óculos de sol, Marilyn Que te tapassem as olheiras E os vestÃgios das lágrimas Como um biombo envergonhado A querer tapar as malformações da Humanidade. Pintavas os lábios com o teu batom vermelho E vestias o teu vestido branco dos homens espantados. Podias ter ido depois fazer qualquer coisa, Marilyn Dar milho aos pombos da cidade Peixinhos aos gatos vadios Ou ossos a cães com fome de uma carÃcia. Por que não te desde sempre conta de como eras especial, Marilyn? Única no mundo Mesmo que tivesses de ser Especial sozinha Ainda no meio das tuas lágrimas Ou no labirinto da sua dolorosa sublimação Nos dias com sol e trovoadas intermitentes. Sabes agora o teu segredo Marilyn? O teu segredo sempre foi seres dolorosamente especial Irreverentemente especial Amplamente especial Tão amplamente especial que o teu largo espetro Onde tantas vezes te sentias tão só Talvez confundisse Antes de clarificar Quem queria ser confundido para não te amar. Por que não tentaste, nem quiseste, Marilyn Experimentar a paz podre De uma boa parte da Humanidade? Por que não tentaste, Marilyn, ignorar os comentários pequeninos Das senhoras vestidas a Channel As mesmas que te invejavam, porque seriam talvez feias, Quando te dissessem Ao menos pensassem Ou murmurassem nas tuas costas “Coitada, da Marilyn Não conseguiu arranjar um homem que lhe acalmasse as ânsias As mesmas ânsias ansiadas pelos homens Incluindo os nossos homens Para todas ficarmos em paz!†A paz podre que não tu quiseste experimentar Marilyn. E tu morreste, Marilyn És agora uma Lenda Uma Imortal Vingaste-te de todos os homens que não te amaram e até dos outros Foste cartaz colado atrás de portas em quartos de estudantes de liceu Alimentando-lhe os sonhos Foste fotografia escondida em carteiras de homens solitários Musa de poemas Musa até deste meu poema Eu que tão bem te entendo e respeito Marilyn Letra e música de tantas canções. Sim, Marilyn Vives ainda E para sempre Nos pensamentos dos homens que não perceberam que o teu segredo Não era afinal segredo nenhum. Sim Marilyn Os Homens dão-se bem com as coisas mortas Para lhes fazerem belos poemas E dedicar-lhes lindas canções Quando os discos pedidos já não tocam na rádio Em lado nenhum. Sabias disto Marilyn? Agora dorme tranquila Haverá sempre um homem, Que pensa que te ama A velar o teu sono E a alimentar de ti os seus próprios sonhos de AMOR impossÃvel.
Gabriela Sá
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