Djabal
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« em: Agosto 11, 2008, 10:35:39 » |
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Seu nome: EcÃdio Jorge Butina; tem cinqüenta anos, trabalha em São Paulo há trinta anos fazendo exatos e mesmos negócios. Talvez a sua denominação mais eficaz seja a de um burocrata mercantil. Não encontra neles nada além do meio de sobrevivência. Faz os seus como se escrevesse uma carta, entretanto com a caligrafia mais elegante possÃvel.
Desenha-os de antemão, como se quisesse que aqueles dessem algum tipo de alegria, beleza ou serenidade para aqueles que participassem. Passava ao largo do mundo empresarial.
Teve um amigo de escola que ocupou um cargo muito importante. Era agora, como se diz uma pessoa graúda. Como naquele momento atravessava dificuldades foi pedir ajuda. Quem sabe poderia melhorar o seu desempenho com alguns pedidos novos. Não queria claro, nada demais, nada de menos. Ou talvez quisesse, não é possÃvel saber nesse momento, ou em outro qualquer, face à impossibilidade de se penetrar na alma alheia. O mais apropriado para descrever seu desejo é relatar a sua frase ensaiada: “Quando tiver um pedido lembre do meu nomeâ€.
Mentalizando esse percurso iniciou sua busca.
- Sim, Butina, senhorita. Nem Bolina, nem Botina.
Foi recebido no gabinete privativo e convidado para participar do café da manhã. Aceitou prontamente, mesmo já tendo tomado o seu, jamais cometeria essa indelicadeza.
Tiveram uma conversa amena, compartilhou das suas agruras num determinado momento; ganhou um gesto afetuoso de mão do amigo, que pegou num telefone e pediu uma ligação, para um publicitário famoso. Recebeu o aviso da secretária, colocou o aparelho em viva voz, após as preliminares de praxe, soltou o verbo:
- Estou aqui com o EcÃdio meu amigo de escola, que faliu. Quebrou. Precisa de sua ajuda. Veja o que você pode fazer por ele.
Teve vontade de parar a conversa para explicar melhor, não, não era bem isso; teve vontade de enfiar a cabeça no chão. Teve vontade imediata de sair. Encerrou delicadamente a conversa. Despediu-se e saiu; surpreso com tal poder de sÃntese.
Foi ouvir o que o destino lhe reservara. Marcou a entrevista com o amigo do amigo. Ouviu um plano mirabolante que envolvia o investimento em propaganda muito acima de qualquer número razoável que lhe poderia passar pela cabeça; esse lhe pareceu o esboço da rota da sua ruÃna.
Ao ganhar a rua tomou a decisão de se trajar de forma diferente. Aboliu o uso da gravata. Foi a sua carta de alforria. Depois de anos servindo a ela, abdicou por inútil.
Recebeu, dias depois, um pedido do exterior. Dos Estados Unidos da América. Dessa vez de um novo cliente, indicado por um outro costumeiro e há mais de trinta anos. Esse novo cliente tem todo interesse em surfar a onda responsável no Brasil. E fez uma gigantesca proposta de compra. Valores fabulosos.
Marcou compromissos com pessoas do setor. Todas suas conhecidas. Ele sempre foi designado como alguém com um perfil suave, não destacado da maioria. Era essa a sua reputação. Estava muito em moda dizer: “Low Profileâ€
Notou os olhares desconfiados em suas entrevistas. Será o traje? Será a postura? Será que o pedido envolvia mesmo aqueles valores? Não seria apenas um sonho, um mito daquele representante?
Não. Não. Agora era a vez do Butina. Sentia-se bem. Ele estava agasalhado contra o pior inverno. Havia chegado à sua hora.
Percebeu na última visita daquele dia um interesse inusual daquele fabricante. O olhar era desconfiado também. Mas fez questão de mandar seu valete acompanhá-lo até o estacionamento, para abrir-lhe a porta do auto. Tudo indicava que ele aceitaria o pedido, no preço e nas condições indicadas. Chegou até o seu carro, um Honda “Civic†Preto, aprendera com seu pai que carro deve ser discreto, ano 90.
Foi almoçar feliz e voltou ao escritório, mandou um email para o fabricante, agradecendo a atenção, o tempo e desejando abrir caminho para novos e eventuais pedidos.
Quase sem surpresa recebeu uma mensagem do servidor que aquele endereço havia sido bloqueado e que a mensagem foi excluÃda sem leitura. Imediatamente veio-lhe o desejo de reler Gogol.
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