pedrojorge
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« em: Dezembro 03, 2007, 21:41:07 » |
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Era natal, as bolas vermelhas e roxas tilintavam nos sinos dourados no interior da montra, entre uma balbúrdia de carrinhos motorizados, de consolas de videojogos e bonecas que respondem mecanicamente, nas suas bochechas humanas plastificadas emaranhava-se os beiços de um rapaz babado deserto para tomar o seu almoço à s 8 da noite. Olhava de novo o adro da Igreja, rodeado por feirantes dominicais, as frutas fora de época, os signos marcados nas testas vestibulares de um cérebro pouco carnudo, a saliva rastejava como água pelo chão, própria da era dos temporais… Flacidamente o céu entreabriu-se, o azulado parecia impróprio, não era um sujeito reticulado que navegaria sem a ajuda de asas como os papagaios monótonos que via, era apenas o céu, um despertar de sensações, dali veria o mundo todo sem o ter… sem precisar de o ter… ou de ter algo… era só estar no céu, a gravidade, uma desconhecida dele, encarregaria de gratuitamente o sobrepor, embora ele nem imaginasse a velocidade ou em que altitudes seria viável, ou então o paradoxo, com o quê? Mas lá bem ele imaginava o que faria os aviões voar, ele bem o sabia, era o próprio avião… não as asas e a velocidade de impulsão constante, nada disso, era o avião consigo mesmo, nada mais, só isso, simplesmente e exclusivamente, não os homens, nada disso, ele mesmo. Atravessou a rua, obedecendo primariamente a uma buzina de um automóvel acima dos 70000 euros, ainda que na passagem dos peões. Rivalizou as coisas dos feirantes, pois nada vale como uma vida humana, pelo menos para a nossa espécie, circulou pelo centro comercial, embora a forma de ser distinta, educação, o quer que seja, nele não haviam comidas feitas, nem recusáveis primariamente, tudo era provado, só depois reclamava, no seu caso, raramente, e quando o fazia, era a pedinchar por mais. Claramente serei eu um mentiroso, e nem o rapaz existia no natal, com a sua vitalidade, com a sua saúde e astúcia, pensamentos, ambições, desejos, visionamentos, era tudo apenas numa clara rua de cidade, numa noite de Natal, um homem expirava as suas velas em casa, cuja luz mais intensa apenas despojava nos seus olhos, saÃa na gélida torrente de chuva glacial, as cáries dos seus dentes não provavam açúcar há anos, por ele, os fornecedores de electricidade e água trabalhariam no dia de Natal, mas só na zona comercial… a não ser que ele usasse o Multibanco. Não haveria ali vida, nem nada, aonde iria ele na consoada? Talvez nem pergunta se possa fazer, pois só teria um sÃtio, único, a rua, a rua que era mirada pelo mandatário, senhorio e tanto mais, do sétimo andar, a rua que no outro lado do mundo era visionada de forma análoga, com outras pertenças e a outros pertencentes. Não, afinal já não havia homem, era um ser. Era outro, em alto mar, as trovoadas, as ondas, os tombos, o convés a encher-se de água e em pleno Verão coabitaria alguém também, as rosadas da face eram brancas, o peixe não existia a milhas a cisbordo, talvez para aquele ser nunca tivesse existido peixe, apenas sonhos, um céu que brilhava, mas só por cima das nuvens que ele nem as percepcionava pela noite cerrada e uma Lua ausente ou dormente, ou então acordada e noutro lado a reflectir. Se estes três se juntassem numa sala e vissem que eram 4 e 5 e 6 e 7 e eram uma percentagem de toda a gente, uma interessante percentagem, que numa árvore de Natal, mesmo que entre eles existissem muitos que nunca sequer ouviram falar dela, ou do Natal, que numa árvore de Natal não existia sequer a comida que eles tanto sonhavam, ou a costa que traria a bonança ou um rochedo, no entanto era sempre o fim da incerteza, não existia… simplesmente o que existia era códigos, cifras desconhecidas, sÃmbolos, sinais de trânsito que dizem: aqui não é o teu caminho! Esta árvore indica que aqui não é a tua casa… Contudo, nem os três se juntaram, a lua brilhou em alguns sÃtios, a noite de Natal passou sem as renas, a estrada principal livre, as janelas cerradas, e as montras seguradas, restaram alguns lá fora, sobre a neve, a deslindarem um sonho gelado…
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