Caminhos de Então

[elvira]

Caminhos de então
 
Dos caminhos da infância,
Percorridos por mil sóis,
Tiro do baú da lembrança
Hoje somente ilusões.

O primeiro cantar do cuco,
O pregão — cuco da Maia, cuco da Beira,
Quantos anos me dás solteira?
Cu-cu, cu-cu, e se eram mais de vinte,
Tristeza, temor de ficar solteira.
Os jogos da cabra-cega,
Os cantares de roda,
O lencinho vai na mão,
Ele vai cair ao chão.

Demorava o lusco-fusco
Até a lua nos trazer os ais
Das ave-marias (santíssima trindade).
Pedia-se a bênção aos pais
E à luz da candeia,
Junto à lareira,
A mãe fazia a ceia
Com batatas, e pouco mais.

Na crua madrugada,
Quando o galo acorda,
Lá ia o pobre mais a sachola
Ganhar no dia uns parcos cobres,
Pois o bolo era dos nobres.
E trabalhando na madrugada
Até a noite já estar cansada
O pobre gastava a vida pra nada.

E quando nos visitava, a neve
Tapava os ninhos de branco puro.
Nos regatos, com as geadas,
Moldavam-se estalactites bem elaboradas.
E na escola, com sonhos na sacola,
Tapávamos os ouvidos às tabuadas,
Ansiosos por jogar à bola.


Nas vindimas,
Como pontos doridos num arraial,
As vindimadeiras, suspirando cantigas,
Cortavam os cachos cor da noite
E de espigas, embriagando formigas
E abelhas, com sons de alegria e fadigas.

Homens levavam em ombros
Ladeira acima os cestos
Carregados de sanguíneo mosto.
Ao toque do acordeão,
Ferrinhos, harmónica, suor
Escorrendo das pregas do rosto,
Chegavam ao lagar, bebiam água-pé,
Felizes pelo obstáculo transposto.

E à noite, em roda, dentro do lagar,
Calças arregaçadas, sempre a cantar
Liberdade, liberdade, quem a tem chama-lhe
sua                                       
Só eu não tenho liberdade, nem de pôr os pés na
                                                           rua.
Os pés, sim, libertavam-se no corridinho ao toque
                                                       do acordeão.
Oh que saudades desses tempos de então.
 

[Nanda]

Elvira,
Levaste-me a fazer um périplo pelos tempos saudáveis de outrora.
Beijinhos
Nanda

[CAMPISTA CABRAL]

Olá Elvira!

Que o tempo de então seja rememorado a todo instante! A todo instante! Gostei dos teus versos!

Abraços do Brasil!

[Dulce Pinho]

Olá, amiga.
Adorei o teu pregão. Será que na tua juventude, por mero acaso, não terás pegado no teu lencinho,
para vendares os olhos do cuco da Maia, ou cuco da Beira? Cá por mim não gostava de ser enganada
por uma simples ave.

Bjos

   Dulce Pinho

[Manuela Matos]

É verdade Elvira!
Descobrimos que somos conterrâneas e lembro-me bem desse tempo em que num dia se fazia tanta coisa...
Bonito poema. Bjs.
Nela

[Oswaldo Eurico Rodrigues]

Elvira, recordar é viver e viver plenamente.
Amei o teu poema mesmo não conhecendo o cuco.

[elvira]

Queridos amigos!

Tempos difíçeis aqueles. Mas quanta nostalgia ao recorda-los.Obrigada
Bj para cada um de vós
Elvira

[Oswaldo Eurico Rodrigues]

Na adversidade, crescemos e aprendemos a valorizar as coisas simples da vida. Sei bem o que é isso... O importante é saborear a vida na choupana ou no castelo.

Gostei tanto do seu texto, que até criei outro ("Nunca ouvi o cuco").

Beijos...

[Goreti Dias]

Cada vez se ouve menos o cuco...
Já conhecia mas adorei reler!
Beijo

[vilde]

Olá elvira!
Tb no teu poema regressei à infância e me confronto com a evolução dos tempos onde essas histórias já não se repetem.
Revivemos e resta-nos a nostalgia.
bjs
vilde

[arfemo]

...poema em estilo de romance, faz-nos reviver factos marcantes da nossa juventude. gostei...bj

[elvira]

Oswaldo, Muito obrigada.  E tem de vir conhecer Portugal , não só ouvir o cuco, como provar o delicioso nectar do Douro.bj amigo
Goreti, Até Os cucos vão perdendo o pio! Obrigada Bj
Vilde, Eu tambem regresso muitas vezes á infânçia. Tempos terríveis...Mas quanta saudade. Obrigada BJ
Arfermo.E quem não gostará de recordar a juventude. Muito obrigada pelo carinho. Bj

[Paulina]

Aproxima-se o Outono e as “Folhas Caídas”…

[CAMPISTA CABRAL]

Reli teu poema e pensei no tempo dentro de nós, aquele em que se pode agora tudo (ir e voltar e lembrar e esquecer e tornar a lembrar de novo). Mais uma vez, parabéns!

Abraços!

[elvira]

Olá, Paulina
Seja muito bem-vinda a este cantinho das letras. Espero que se sinta por cá muito bem.
Sim aproxima-se o Outono, mas, que no seu caminho reine sempre o perfume da primavera. Obrigada pelo comentário. Bj Elvira

Olá, caro campista, mais uma vez obrigada. Por esta altura do ano,o Douro é palco de grande actividade, e muitas festas, As vindimas. Se perder um pouco de tempo a pesquisar( quer no Pinhão, ou Gouvães do Douro de onde sou oriunda, facará surpreendido com tamanha beleza. Obrigada por reler. Bj Elvira

[CAMPISTA CABRAL]

É sempre bom retornar a um bom texto! E a memória e o tempo são assim: paisagens reais e imaginárias e sonhadas e sentidas. Pela sua descrição posso antever um cenário belíssimo! Moro em Teresópolis, cidade da região serrana do estado do Rio de Janeiro. As montanhas e a baía de Guanabara que vejo bem pequenina são in=magens para poemas!

Um grande abraço!

[elvira]

Olá, caro campista
 Mais uma vez obrigada. Por esta altura do ano,o Douro é palco de grande actividade, as vindimas. Se perder um pouco de tempo a pesquisar( quer no Pinhão, ou Gouvães do Douro de onde sou oriunda, facará surpreendido com tamanha beleza. Obrigada por reler. Bj Elvira