Nação Valente
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outono
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« em: Outubro 13, 2011, 16:47:55 » |
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Gungunhana senta-te. Aonde ? No chão. Está sujo. Senta-te ! O negro imperador dos vátuas, calou o seu português cosmopolita, dobrou-se, em pose cinéfila, sobre o enorme corpanzil e ajoelhou aos pés do capitão Paiva Couceiro /Barra Jorge Brum do Canto, sob ameaça da sua afiada espada. Os soldados, limpinhos e austeros na sua farda engomada, olhavam embevecidos para as mamas ao léu das negras mais belas do casting. Nesta cena do filme Chaimite concentra-se o climax da acção. Os guerreiros/ figurantes, do régulo, batem nos escudos em sinal de submissão ao poderoso rei dos portugueses. Os espectadores sentados em frente do ecran improvisado na parede da igreja, acompanham-nos batendo palmas. A fita dá as últimas voltas nas bobines do projector do SNI, as imagens de sombra e luz apagam-se, depois da palavra fim. O equipamento de projecção regressa à camioneta da propaganda, como era conhecida, para partir para outra aldeia na sua missão de levar a cultura do regime do Estado Novo ao velho paÃs rural.
Gungunhana senta-te Aonde? No chão. Está sujo. Senta-te! O pequeno David /Barra Gungunhana de cara negra de carvão, começa com o máximo realismo o ritual de imitação, mas o Penina /Barra Paiva Couceiro ignora o guião e descarrega-lhe a espada barra pedaço de pau no lombo esquelético. -Despacha-te preto nojento, disse o Penina arvorado em capitão, sem farda. Gungunhana Barra David caiu redondo na terra enlameada pela última chuvada, escondendo a cabeça entre as mãos, em boa hora, pois já o Paiva Couceiro Barra Penina lhe assentava outra traulitada mesmo no toutiço. A tropa de maltrapilhos de palmo e meio, meio rotos, meio descalços olhava incrédula. Dos olhos do David Barra Gungunhana jorravam rios de lágrimas que lhe transformavam o rosto assustado e preto de carvão da forja do seu pai ferrador, numa paisagem patética. -Deixa-me, dizia o pequeno David numa voz entrecortada de soluços, enquanto o Penina continuava a malhar sem piedade. Os seus lancinantes gritos ecoavam até nos corações mais empedernidos. E não fosse eu, (figurante/soldado daquela encenação e agora narrador presente), tão franzino e o alarve do Penina tão avantajado, ter-lhe-ia dado um valente pontapé numas partes bem sensÃveis. Contrariado, engoli a minha raiva, mas não consegui evitar que o coração quase me saÃsse do peito e uma lágrima furtiva e teimosa fizesse o seu papel libertador de escape de emoções. Ouviu-se então o Tomás, um calmeirão e subcomandante que queria ser oficial da marinha (e foi) que olhando ameaçador para o Penina disse: -pára idiota, deixa o "desinfeliz" …porra pá, isto não é uma guerra a sério! E enquanto o Penina se afastava, como cão rafeiro com o rabo entre as pernas, agarrou no David, levantando-o do chão e dizendo-lhe, numa voz em transição, enevoada por fragmentos de ternura: -desculpa…e mudando de tom: porra pá (começava sempre assim e acho que ainda começa) …olha, ao menos aprendeste que se não é fácil ser preto, mesmo em terra de pretos, ser preto e Gungunhana é uma porra em terra de brancos. Gungunhana Barra David, nasceu e morreu ali naquela tarde de brincadeira, mas o David Barra Gungunhana ficou bem vivo e guardado numa gavetinha da minha memória. Hoje é o dia em que o liberto e ressuscito em letra de forma, até porque estou convicto que pelo menos no mundo /barra ficção o Penina não lhe pode fazer mal. MG
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