breve ensaio ao tempo

[antónio paiva]

tempo breve, lento o tempo,
tempo arredio em marcha de caranguejo.
tempo esguio mentiroso e fugidio,
tempo seco barbatana de raia no estio.

e um tempo a embalar a insónia,
à espera que o sono escorra pelos beirais.
tempo de cópula dos ponteiros do relógio,
no cio dos segundos em orgasmo estéril.

o tempo das cigarras em desgarrada,
das corujas em desmesurado pio.
faz-me tanta falta, o tempo
que medeia entre a proa e a ré do navio.

meço o tempo onda a onda,
o tempo breve onde respiro liberto.
num tempo vago e de horizonte aberto,
densa partitura de instantes mínimos.

e tudo se agita num silêncio,
tão breve quanto o meu tempo.
o tempo se esfumou sem eu dar conta,
e a noite desfez o céu ainda há pouco em presença.

[Abgalvão]

Confesso não ter sido fácil, à primeira leitura, entender o seu poema. Depois de o ler várias vezes acabei por apreciar e, ao que julgo, entender a mensagem.
Poemas e músicas, as melhores, nem sempre são as que "entram" logo no ouvido, por isso, tenho por hábito ler e reler, em voz alta, os poemas que desafiam o meu entendimento e, na maior parte das vezes, acabo por gostar muito deles como é o caso.
 Cumprimentos
Abgalvão

[Goreti Dias]

Ensaiar o tempo num tempo sem tempo...
Gostei!!!
Beijo

[Sandra Fonseca]

O tempo é como um outro sentido do corpo, como um orgão que sangra lento.
É maravilhosa a sua palavra. É arte.
Beijo.


O TEMPO

 
 
Cavalo sem freio,
Vertigem de vento,
A fome, a voragem,
O tempo.
 
O fogo na palha,
O risco na pele
Ferida à limalha de ferro,
O tempo.
 
O eco passado
A dor sem bandagem,
A letra, o poema,
O tempo.
 
O ácido da palavra
Corroendo lento,
Ferrugem, o pensamento,
O tempo.
 
O poço fundo,
O escuro, o medo
Desenhando no espelho,
O tempo.

O galope dos sonhos,
Visões na noite,
Os gestos passageiros,
O tempo.

A vaga inominável
A boca das horas devoradas
Momentos,
O tempo.

A estrada afunilada,
A fresta, o vão desejo,
Cortando a carne,
O tempo.

As aves, a revoada,
O instante das asas,
O plano sobre o infinito,
O tempo.

O rio, a estrada
Calcorreada no pó,
Sangrando a rota,
O tempo.

A sangria desatada,
A correria dos anseios,
A areia no sorvedouro,
O tempo.

Sandra Fonseca

[antónio paiva]

...

caro Abgalvão,

entendo-o perfeitamente, até porque a minha escrita é mais transpirada do que inspirada.

e quanto ao seu entendimento do poema, ele é, sem dúvida muito mais importante, do que aquilo que eu possa ou não, ter como intenção de dizer.

grato.

abraço.

...

Goreti,

nunca o tempo bastou ou bastará ao tempo, por mais ensaios que se façam.

grato.

beijo.

...

Sandra Fonseca,

menina da sobriedade generosa, mulher poema vivo.

quanta estima e carinho lhe devoto.

grato.

beijo.

[vilde]

Um tempo bem ensaiado
escorrido, escarchado,
dividido, pernoitado,
amassado, emprenhado,
engolido, ensopado,
um tempo estropiado
e mal ou bem aproveitado
neste leite derramado...

Um bj
vilde

[antónio paiva]

...

caro Domingos da Mota,

Sophia, diria e dirá para sempre, com toda a substância e propriedade, a todo o tempo.

grato.

...

vilde,

e no tempo florescem versos.

é isso mesmo.

grato.

beijinho