António Casado
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« em: Dezembro 08, 2013, 01:22:01 » |
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É a primeira vez que neste espaço coloco algo escrito sobre o tempo. Este texto - temo chamar-lhe poema - vai ser publicado tal qual o escrevi neste preciso momento. Desculpem-me algum erro.
António Casado________ 8 Dezembro 2013
ALUNO DO MUNDO -
Já esgotei o tempo que cruzava os ponteiros do relógio O fazia tomá-lo como meu Acelerava as solas que percorriam caminhos de lama E deixavam-me tonto e perdido… Esgotei o tempo… Talvez tenha esgotado o medo… Talvez tenha deixado a minha sombra numa árvore Ou no ocaso de um arbusto vencido pela esterilidade Da minha busca pelo sol que nunca houvera de ser meu…
Acordo no meio das flores que me perguntam quem sou Enquanto abro a página da botânica E procuro descobrir quem são, como se chamam Como se o nome fosse importante e um ar de sabedoria Resvalasse das pedras lunares e tombasse no pátio Da minha casa submersa no centro do desperdÃcio Que faço dos dias sem saber que mais hei-de fazer.
Não me apetece. Não, não quero sequer escrever. Talvez fizesse um favor à humanidade dedicar-me ao silêncio Passar como os que passam sem uma marca na estrada Uma ruga na testa ou uma mão esquecida no ar Num gesto impreciso de tão obsceno Num gesto intranquilo, num afago morno ou sereno À volta do pescoço que entrego ao luar.
Vi os segundos cruzarem as veias e envelhecê-las Como tudo o que envelhece e fica velho Sem ter no futuro uma perspectiva de futuro Nesse horizonte outrora nublado de luzes e néon Onde acrescentei azulejos de todas as cores Para marcar no hoje a presença de um ontem Que não tenho a certeza de ter vivido Ou de ter acontecido Apenas porque passei por ele como os que passam Indiferente aos raios do sol ou aos gritos Que procuraram no meu peito um pedaço de luz E encontraram um travesseiro de orgulho Tão rijo e inseguro como um pedaço de ferro Desfeito algures no verbo marear…
Cruzei o tempo… Apenas cruzei o tempo… Nunca tive uma direcção, nunca conheci um sinal Nunca escrevi o deleite dos pesadelos nas folhas das orquÃdeas.
Agora não cruzo mais nada. Deixo-me levar pelo vento Porque o vento não se preocupa com direcções, vai Nesse ir me arrasto e imagino que sou feliz indo Sem mesmo saber que mundo estará para além da viagem No sedentarismo cómodo da chegada a lado nenhum…
Não estou aqui, eu sei, porque estaria aqui? Porque denunciaria a minha presença se a passada revolta Me condenou ao sorriso sempre atento e desperto Onde sou feliz na proporção da felicidade ou da irrealidade Que encontro nas esquinas que ficam lá em baixo No giro constante que o vento faz com que aconteça.
Hoje relembro a necessidade de uma mensagem Uma só que fosse de uma pureza e leviandade não sentidas Que representasse um quadro qualquer expressionista E a todos fizesse recuar para atrocidades cometidas Nas sociedades que existiram ao longo do planeta…
Esqueci a mensagem nalgum pergaminho queimado numa lareira Porque nada de novo acrescentava à cultura de todo um colectivo Que só não foi meu porque eu sempre fui o meu colectivo Mesmo quando me quis integrar em todos os grupos Mesmo quando quis que todos eles me fizessem sua pertença Enquanto me predispus a pertencer-lhe de coração e nervos Para gritar com eles os mesmos gritos Para discursar os mesmos discursos Para ser…
Passei… Passei como os que passam Pelo intervalo dos minutos sem fundamento ou lógica Marcando individualmente em cada um a ironia Da ignorância sobre tudo que sempre me assistiu E que apresentei como um misto de cultura e serenidade. É isso mesmo. Um misto de cultura e serenidade…. O que é a cultura? A procura da serenidade do conhecimento Ou a ebriedade do saber quando não se sabe o que se sabe Porque há sempre muito para além do que se conhece E o que conheço é apenas o secreto mundo da metafÃsica Criada à volta da cintura da imaginação para que seja real E tente na utopia das palavras esfregadas no chão Um literato discurso recheado de vazio…
Sim, que sei eu… E ao dizê-lo o compêndio da filosofia Abana entre a porta de entrada do jardim onde durmo E a janela que não abro porque não sei onde está Então brota à luz do dia o conhecimento de quem conhece E fala da filosofia como quem fala de outra coisa qualquer Profundo conhecedor de coisa nenhuma num misto universal Tão cheio de vazios, tão cheios de ocos, tão cheio de nadas Que a aflição de uma ambulância avariada num cruzamento Deixa escapar a vida ao doente que transporta Mesmo quando não há doente, nem encruzilhada, nem ambulância E todo o discurso é premiado pela medida do protagonismo Que no passado me fez fazer um banco de madeira sem pregos Para me pôr sobre ele e dizer que estava ali Porque sempre estive ali de pé mesmo quando não havia banco Sem mesmo saber o porquê de estar naquele local e gritar Quando nem sabia que podia gritar nem o que gritar Apenas porque o grito podia ser uma metáfora E um monte de mentes iluminadas retiraria do meu vazio discurso Talvez o caminho que não vi, não soube que existia, não cruzei Mas falei dele como quem fala de uma sandes de fiambre E ainda que nem saiba fazer a massa ou conheça o tempo de levedura Tem a breve lunática noção de que talvez seja feita com farinha… Talvez… Talvez tivesse inventado um mundo e talvez vivesse nele Porque alguém um dia me disse que gostou de saber Que o pão de que falava era feito de farinha e ciência Como se essa mensagem contivesse toda a sabedoria Ou como se a sabedoria se contivesse no abstracto da mensagem.
Sou eu. Ignorante das causas que defendo, perdido Entre tudo o que gostaria de ter lido e sabido e o que não sei Perdido entre tantos discursos e palavras belas que me perderam Noutras viagens, noutros sonhos, noutro lunatismo Que acreditei pudesse ser parte da minha viagem… E eu tenho lá viagem! Cimentei os pés no chão desta terra e deixei-me ficar pelos postais Que me mostravam imagens lindas… Fragmentos de sonhos Que tanto quis percorrer e que de uma forma covarde e errante Colei num pequeno livro que depois depus no lixo Porque não sabia que fazer com ele.
Atenção… O banco nem precisa desfazer-se O vento nem precisa parar Cairei na mesma porque não há como sustentar a ignorância Nem como fazer prevalecer a mentira do que sei Confrontado com a peneira de ter a certeza que sabendo Não formo um único puzzle credÃvel nem lógico Algo que alguém um dia possa tirar ilações futuras…
Sou eu, sim. Com ou sem banco, distraÃdo da vida Defendendo as velas quebradas do meu pesadelo À espera de nunca acordar Para não me deparar Com a minha ignorância!
Se não fui onde quis Também não quis ir onde estive. Apenas tentei sobreviver… Apenas tentei…
Porque não é o conhecimento a nuvem onde moro E possa dizer o que nem ouso pensar Porque não sei?
Esgotei o tempo e como bom aluno esvaziei-me no mérito do meu vazio.
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