Mel de Carvalho
|
|
« em: Março 21, 2008, 22:36:09 » |
|
Quando a minha alma estava ferida, o corpo ferido igualmente, o Inverno se anunciava inóspito, desabrigado, gelado, - Antárctica de neves perenes... Quando de mim todos os mares se ausentaram... Todas as luas cheias se afogaram despenhadas em imensos Oceanos... Quando os afagos de uns olhos onde repousava os meus olhos se me fugiram - Sol... Eu era agueiro, tromba de água rio de montanha, veloz e frio... Ai, nesse preciso momento... Não chegou pessoa alguma. Nem flores, nem Sóis, nem sequer murmúrios marulhados de ondas... Nem risos, sorrisos... esperança... Quando dentro de mim apenas habitava o vácuo e o vazio... Quando nua, despida de mim própria, avançava louca pela rua, a busca de um amor maior, de uma paz permanente, que de ausente, me tornava tão doente, não encontrei mão amiga, nem abraços, nem beijos, nem sequer quem me amparasse quando, enjoada, me enrodilhava dentro do meu próprio ventre... e me despenhava no negro da rua... Quando, nesta agonia, noite e dia, vagueava... Pendulava na ponta de uma fraga... perdida de mim, sem rumo, meio ou fim... Não... não encontrei o carinho de abraços - os que pedia... (tão magoada aos poucos sucumbia, algemada no sentido de os receber...). Morria no desalento... e nada acontecia... Ai, nesse momento, alguém com voz de vento bateu à porta... Com medo abri... Tinha forma imprecisa e hálito quente... Tomou-me ali mesmo, nua, e fez-me sua... Beijou-me as lágrimas, sorveu-me no beijo ardente parte da dor... Secou-me com pontas asas aladas os tremores suores do corpo... Aninhou-se pelos poros da minha pele, mim a dentro - talvez para sempre e lá habita -, (é hoje o meu diário alimento). Companheira de todas as horas, dia e noite, noite e dia... Tem os tons da maresia, o negro da ventania, o brilho da utopia... SIM, Falo de ti POESIA...
Fizeste de mim esta criança, que temerosa ainda... guiada pela tua sábia mão avança, no traçado dos caminhos poéticos ou de prosa... Eu, a tal, a deposta Rosa, vagueio agora amparada, colada com a madrugada... Eu, Rosa do Nada!!! Poesia... Obrigada! Amiga... Devolveste-me a vida!!!
In Sibilam Pedras na Encosta, de Mel de Carvalho, Ed. Corpos, 2007
|